sábado, 22 de junho de 2013

ADICIONAL DE PERICULOSIDADE EM SITUAÇÃO DE RISCO DE VIDA. APLICABILIDADE DA LEI Nº 12.740, DE 08/12/2012. PROFISSIONAIS VIGILANTES

ADICIONAL DE PERICULOSIDADE EM SITUAÇÃO DE RISCO DE VIDA. APLICABILIDADE DA LEI Nº 12.740, DE 08/12/2012. PROFISSIONAIS VIGILANTES
(atualizado em 18/02/2013)

Francisco Gérson Marques de Lima
Professor da UFC, Doutor, 
Procurador Regional do Trabalho (Ceará)

Sumário: 1 – Introdução; 2 – Causas e custos da nova Lei; 3 – Os profissionais vigilantes e o PL 1.033/2003. Alcance da norma; 4 – Normas de segurança e proteção à saúde dos trabalhadores; 5 – Aplicação imediata da Lei nº 12.740/2012; 6 – Medidas para assegurar o cumprimento imediato do art. 193, CLT, e as negociações coletivas; 7 – Conclusões; Referências bibliográficas. 

1. Introdução:

Foi editada a Lei nº 12.740, de 08.12.2012, que qualifica algumas atividades como sendo de risco, ao passo que estende aos trabalhadores do setor adicional de 30% sobre o salário. Com a alteração, a nova redação do art. 193, da CLT, ficou assim:
“Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude da exposição permanente do trabalhador a:
I – inflamáveis, explosivos ou energia elétrica;
II – roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial.(incluído pela Lei nº 12.740/2012). 
§ 1º. O trabalho em condições de periculosidade assegura ao empregado um adicional de 30% (trinta por cento) sobre o salário sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa. 
§ 2º. O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido. 
§ 3º. Serão descontados ou compensados do adicional outros da mesma natureza eventualmente já concedidos ao vigilante por meio de acordo coletivo” (incluído pela Lei nº 12.740/2012).

Na redação anterior, o artigo não era dividido em incisos, e seu caput se encontrava assim redigido:
“Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem o contato permanente com inflamáveis ou explosivos em condições de risco acentuado.”Prof. Francisco Gérson Marques de Lima (fev/2013)

Observe-se que o caput não foi alterado em sua essência. Permaneceu a mesma remissão à regulamentação de atividades pelo Ministério do Trabalho [e Emprego], a mesma referência a métodos do trabalho etc. Mudou ou inverteu alguns termos, por mera necessidade de adequação: ao invés de “contato permanente (...) em condições de risco acentuado”, ficou “risco acentuado em virtude da exposição permanente”. O espírito normativo continuou o mesmo, que é a referência à atividade de risco. 

É verdade que o inc. I não apenas repetiu o que o caput do art. 193, CLT, continha, eis que acrescentou atividade com energia elétrica. Mas a legislação complementar já tratava desta atividade, que amadureceu depois da redação conferida pela CLT: Lei nº 7.369/1985, que reconheceu natureza perigosa à atividade desenvolvida no setor elétrico; e NR-10, do MTE, que regulamentou esta Lei, no referente às condições de segurança no trabalho. Por força da Lei nº 12.740/2012 (art. 3º), ficou revogada a Lei nº 7.369/1985, cuja previsão passou a constar do caput do art. 193, CLT, evitando qualquer prejuízo legal. O fenômeno, aí, portanto, foi de mera concentração de dispositivos legais, sem que, no contexto legislativo, tenha sido arranhada a proteção ou a natureza desenvolvida por trabalhadores que interajam em instalações elétricas e serviços com eletricidade. Uma vez que houve mera migração de previsão normativa, a NR-10, MTE, continua em pleno vigor, pois compatível e prevista no caput do art. 193. 

Porém, o principal motivo de o legislador haver alterado o art. 193, CLT, foi exatamente o acréscimo de mais uma atividade, apontada como perigosa: o serviço que submeta o trabalhador a risco de “roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial”.Dispõe o art. 2º da Lei 12.740/2012 que “esta lei entra em vigor na data de sua publicação”. O Diário Oficial da União a publicou em 10.12.2012. 

Todavia, apesar de sua previsão normativa, a Lei não conseguiu uniformizar a compreensão da teia dos hermeneutas, atraindo resistências empresariais em sua aplicação e divergência interpretativa. É o que se vê, por amostragem, dos informes a seguir, dos primeiros meses de sua vigência:

Caixa Econômica Federal, São Paulo. A CEF/São Paulo realizou pregão para contratação de empresa de vigilância, já incluindo na planilha de custos o adicional de risco de vida de 30%. Inicialmente, ao lançar o aviso de licitação de 03/12/2012, publicado no Diário de São Paulo, não previa o pagamento do referido adicional. Com a sobrevinda da Lei nº 12.740/2012, a CEF/SP publicou uma retificação no Edital, ampliando o Preço Máximo Admitido, para acrescentar o pagamento do Adicional de 30% de periculosidade (15/01/2013), em cumprimento a determinação do Tribunal de Contas da União (TCU). 
______________________________________________________________________
Tribunal de Contas da União (TCU), Brasília. O TCU entendeu que a Lei nº 12.740/2012 é autoaplicável e determinou que a CEF/SP adequasse a planilha de custos, para contemplar os 30% do adicional de periculosidade dos serviços de vigilância (v. acima). TC-046.163/2012-3 (apenso: TC-046.442/2012-0), Min. Valmir Campelo, 10/01/2013. 

Representantes: empresa Copseg Segurança e Vigilância Ltda. (CNPJ 03.038.653/0001-58) e Sindicato das Empresas de Segurança Privada, Segurança Eletrônica, Serviços de Escolta e Cursos de Formação do Estado de São Paulo - SESVESP (CNPJ 53.821.401/0001-79).
________________________________________________________________________
Receita Federal, Campinas. Licitação pela Receita Federal do Brasil de Julgamento em Campinas, 21/01/2013, com preços que levam em conta a Lei nº 12.740, de 8 de dezembro de 2012, que alterou o art. 193 da CLT, que instituiu o Adicional de Periculosidade de 30% aos Vigilantes (Proc. Nº: 17546.000118/2012-15, Pregão Eletrônico/DRJ/CPS n° 5/2012). 
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AUDIN/MPU, Brasília. A Auditoria Interna do Ministério Público da União, em caso idêntico ao da Caixa Econômica Federal de São Paulo, apreciando provocação da Prof. Francisco Gérson Marques de Lima (fev/2013).
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Procuradoria da República de São Paulo, teve entendimento diverso. Para a AUDIN, a Lei nº 12.740/2012 precisa ser regulamentada para ser aplicada. Veja-se, direto da fonte:
“Referência: E-mail de 19/12/2012. AUDIN/MPU – 1285/2012.

Assunto: Administrativo. Pregão para contratação de serviço de vigilância. Adicional de 30% sobre os salários dos vigilantes. Lei nº 12.740/2012. Impugnação de edital por não considerar o percentual no valor máximo para contratação. 
Interessado: Secretaria Estadual. Procuradoria da República do Estado de São Paulo.
(...).

3. Em exame, importa notar que o dispositivo legal que alterou o art. 193 da CLT exige edição de regulamento pelo Ministério do Trabalho e Emprego das atividades ou operações perigosas que colocam em risco os empregados expostos a roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoa ou patrimonial. Vale observar quando da edição da Lei nº 7.369, de 20 de setembro de 1985, revogada pela atual Lei nº 12.740/2012, o Ministério do Trabalho editou a NR-16 para 
regulamentar a matéria ali tratada.

4. Assim, somos de parecer pela improcedência da impugnação apresentada pela empresa Security Vigilância Patrimonial contra os valores máximos previstos no Edital nº 3/2012, devendo-se observar a Convenção Coletiva vigente da categoria para composição dos valores da planilha de custos e formação de preços”. Brasília, 15 de janeiro de 2013. 

Parecer aprovado pelo Auditor-Chefe, na mesma data. In http://www.audin.mpu.gov.br/bases/pareceres/RSC001-2013-PRSP-pagamento-de-adicional-lei12740.pdf, acessado em 17/02/2013. 
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Justiça do Trabalho, São Paulo. Em apreciação liminar, na ação judicial Proc. 242/2013, a 42ª Vara do Trabalho de São Paulo/Capital determinou o fim das paralisações dos vigilantes, que entendeu ver nelas coação ao empresariado, e despachou no sentido de suspender a eficácia e a exigibilidade do art. 193,II, CLT, até que sobrevenha regulamentação pelo MTE, em favor das empresas associadas à autora (Associação Brasileira de Empresas de Vigilância e Segurança -ABREVIS). Data: 05/02/2013. In 
http://s.conjur.com.br/dl/adicional-vigilante-decisao-tj-sp.pdf e http://vigilanciaseguranca.blogspot.com.br/2013/02/greve-dos-vigilantes-2013-juizado.html, acessados em 17/02/2013.1
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Ministério do Trabalho e Emprego, Brasília. O MTE havia sinalizado no mesmo sentido da Ação 242/2013, em email de que as empresas se utilizaram no processo judicial, e que serviu para o deferimento da liminar acima referenciada, pela Justiça do Trabalho: 
"Conforme instituído no caput do artigo 193 da CLT, ao Ministério do Trabalho e Emprego compete promover a regulamentação das atividades ou operações perigosas. Neste sentido, informa-se que foi constituído Grupo Técnico composto por Auditores Fiscais do Trabalho, a fim de elaborar proposta de regulamentação das alterações legislativas promovidas. Coord. de Normatização e Registros, CGNOR/DSST/SIT." 09/01/2013 (in http://senhoraseguranca.com.br/?p=1560,, acessado em 17/02/2013).

A decisão precária, ainda não definitiva, concluiu assim: “Ante o exposto, defiro o pedido liminar para suspender provisoriamente a eficácia e a exigibilidade de cumprimento do art. 193, II, da CLT, pelas empresas associadas à Autora antes do advento da norma regulamentadora a ser expedida pelo Ministério do Trabalho, determinando-se às Rés que se abstenham de praticar quaisquer atos de coação para exigir-lhes o pagamento imediato do adicional de periculosidade. Cite-se o réu para que apresente defesa em 10 dias. Intime-se. Fixo multa diária no valor de R$ 10.000,00, em caso de descumprimento. São Paulo, 05/02/2013. Lycanthia Carolina Ramage, Juíza do Trabalho” (Proc. 242/2013).

O que se percebe, todavia, é que, em todas estas situações decisórias, favoráveis ou desfavoráveis à aplicação imediata da Lei nº 12.740/2012, falta aprofundamento jurídico e social, data vênia. Daí, nasceu o propósito deste artigo em contribuir para o aclaramento da pretensão normativa e sua auto-aplicabilidade.

2. Causas e custos da nova Lei:

Sem dúvida, a norma referida acarretará aumento de custos para as empresas que lidam com os trabalhadores por ela abrangidos. E é um acréscimo considerável, em face do adicional de 30% sobre o salário, o que repercutirá nas férias, repousos semanais, horas extras, 13º salário e outros. A isto se ajuntem, ainda, os encargos sociais incidentes na folha de pagamento (INSS, FGTS etc.). 

Como o serviço de segurança é, tipicamente, terceirizado, a conta final tenderá a ser repassada ao beneficiário da segurança contratada, ou seja, bancos, repartições públicas, condomínios, shoppings, joalherias, empresas em geral etc. Então, haverá um desencadeamento de repasse de contas, tendendo a chegar ao consumidor derradeiro, ao cidadão que contribui para o fisco, que é cliente do banco, que mora em condomínios, que compra nas lojas e no comércio em geral. É que, no final, alguém pagará a conta. E lá vêm os aumentos de preços e de tarifas. Talvez isto sirva como um motivo a mais para majoração de preços de produtos e serviços. 

Nos shoppings e aeroportos, por exemplo, cujas taxas de estacionamento aumentam periodicamente (e iniciaram 2013 com novos valores – muito além da inflação e do reajuste do salário mínimo), provavelmente ocorrerão tentativas de aumentar, outra vez, os valores das “tarifas” de permanência. 

Os contratos de serviço de vigilância serão revistos, com discussões sobre o reequilíbrio econômico-financeiro. A conta causada pelo pagamento do adicional de periculosidade não será suportada apenas pela empresa que presta serviços de vigilância. No mínimo, será dividida ou repassada ao tomador dos serviços, que talvez a repasse a outrem, e assim sucessivamente, até chegar ao consumidor final. É sempre ele quem paga a conta.

De todas estes contratantes, sem dúvida alguma os que possuem melhor condição financeira para suportar o ônus contratual são os bancos, cujos lucros tem aumentado a cada ano, e as grandes empresas de estacionamento. Os que mais sofrerão serão os pequenos condomínios residenciais e as empresas de pequeno ou médio porte. 

A principal causa remota do adicional de risco de vida, erroneamente qualificado pela lei como adicional de periculosidade, é o aumento da violência, a deficiência do Estado em garantir a segurança pública. Portanto, ao fundo, existe uma culpa social do Estado e da própria população, que elege mal seus dirigentes e não consegue cobrar medidas mais enérgicas e eficientes no combate à criminalidade. É certo que a existência da criminalidade dá emprego, mas, também, pode tirar vidas. E o número de trabalhadores no setor aumenta, em complemento ao serviço que não é prestado satisfatoriamente pelo Estado. Mais cedo ou mais tarde a matéria receberia regulamentação, não só sob o ponto de vista dos requisitos para o exercício da profissão, mas igualmente sob a ótica de proteção aos trabalhadores. E esta luta foi encampada há anos pelos profissionais vigilantes, cuja merecida vitória adveio com a Lei nº 12.740/2012. 

As conquistas mais destacadas ocorreram por meio de negociações coletivas de trabalho, nas quais a categoria conseguiu, ao longo do país, cláusula específica criando o adicional, em percentuais e valores que variavam em várias localidades, a depender da força dos sindicatos. É por isso que a Lei nº 12.740/2012 fez inserir o seguinte parágrafo ao art. 193, CLT: “§ 3º. Serão descontados ou compensados do adicional outros da mesma natureza eventualmente já concedidos ao vigilante por meio de acordo coletivo”. Deste modo, o impacto na folha salarial das empresas não será, rigorosamente, de 30% e seus encargos, mas, sim, da diferença entre este percentual e o que já existir, por força dos instrumentos coletivos de trabalho vigentes.

É fácil compreender, então, que a causa próxima da criação do referido adicional de periculosidade é o risco de vida a que estão submetidos os profissionais vigilantes. Em alguns setores da profissão, este risco é mais evidente, muito mais acentuado, a exemplo da atividade de transporte de valores e vigilância bancária, eis que os carros-fortes e os bancos são alvo constante de assaltos. E mais: assaltos regrados a grande violência, com uso de armamentos pesados e quadrilhas cada dia mais qualificadas. 

Os assaltos a bancos continuam freqüentes e em ascensão. Obviamente, não têm recebido a devida divulgação, porque isso prejudica a imagem e a confiabilidade da instituição bancária. Não se divulga tudo.Então, sonega-se muita informação, que não chega ao público ou chega distorcida, sem a mesma violência. O número de trabalhadores feridos à bala, mortos, invalidados, tem aumentado a cada dia. Os instrumentos de proteção se tornam obsoletos e a sua qualificação constitui um misto de saber reagir no momento exato, com a precisão que o caso requer, e saber defender a si próprio, ao patrimônio empresarial e a terceiros. Se mata o bandido, tem de responder perante a Polícia e a Justiça – sem o devido reconhecimento da empresa nem, muito menos, a defesa por seus advogados – , porque estava cumprindo, nada mais nada menos, do que o seu trabalho; se morre, a família tem de se contentar com a indenização negociada, quando não recebe nada (porque o morto é sempre o culpado pelos acidentes); e se é alvejado, passando a ser portador de alguma deficiência, é despedido, porque precisa estar completamente são para exercer a profissão (Lei nº 7.102/1983, art. 16-V)– e receberá, provavelmente, tratamento médico essencial (e só o essencial), com uma indenização que não cobrirá os reais danos sofridos. Novo emprego? Dependerá do grau de deficiência e de saber realizar outra atividade. Dificilmente a empresa aproveitará o trabalhador deficiente em outra função. E só o manterá em seus quadros pelo tempo estritamente estabelecido para a estabilidade acidentária.

Qualquer pessoa que presencie o abastecimento ou reposição de dinheiro em caixas bancários ou o transporte de valores pelos carros-fortes se deparará com uma cena chocante, de alto risco: trabalhadores vigilantes inquietos, apreensivos, de escopetas em punho, desconfiando de todo mundo, atentos ao menor gesto suspeito, contando com a possibilidade de serem abordados e de ter de reagir imediatamente. Uma cena que amedronta os pacatos, os que não vivenciam de perto esta realidade. A situação é de risco, sem dúvida alguma. O mesmo se diga dos vigilantes que, armados, precisam passar noites em claro, defendendo patrimônios ou pessoas, com os olhos atentos à escuridão, observando as sombras e se predispondo a ataques. Sabem que o perigo os espreita e pode surgir de qualquer lugar. 

Esta condição dos vigilantes não requer nenhum senso de genialidade ou de perícia por médico ou engenheiro para se perceber o elevado risco de vida do profissional. Insistir nesta demonstração seria o mesmo que duvidar da inteligência do leitor. 

3. Os profissionais vigilantes e o PL 1.033/2003. Alcance da norma:

Os profissionais vigilantes são regidos pela Lei nº 7.102/1983, que estabelece requisitos para o exercício da profissão, condições para funcionamento das empresas que exploram esta atividade, regramentos sobre o licenciamento e porte de armas, o papel da Polícia etc. 

Valentin Carrion tece o seguinte comentário, que diferencia vigilante de vigia:

Vigilante e vigia. Segundo a lei, vigilante é o empregado contratado para proceder à vigilância patrimonial das instituições financeiras e de outros estabelecimentos, públicos ou privados, bem como a segurança de pessoas físicas; realizar o transporte de valores ou garantir o transporte de qualquer outro tipo de carga. As empresas especializadas em prestação de serviços de segurança, vigilância e transporte de valores poderão prestar serviços de segurança privada a pessoas; estabelecimentos comerciais, industriais, de prestação de serviços e residências; a entidades sem fins lucrativos e órgãos e empresas públicas, com os requisitos previstos em lei (L. 7.102/83, alt. L. 8.863/94, 9.017/95, 2.184/01, 11.718/08 e D. 89.056/83, red. D. 1.592/95, v. Índ. Leg.). Os serviços de vigilante podem ser contratados tanto por pessoa física quanto jurídica. É duvidoso que os vigias residenciais, sendo considerados empregados domésticos, integrem a categoria diferenciada.

Vigia é o que exerce tarefas de observação e fiscalização do local, sem os requisitos formais, estritos dos vigilantes. Seus direitos são os comuns dos trabalhadores urbanos, conforme sejam domésticos ou não. Os vigias de rua que atendem diversos moradores, geralmente do mesmo quarteirão, não tem relação trabalhista, não podendo ser comparados com os vigias dos condomínios; neste último caso, há uma administração responsável, unificada, com personalidade jurídica ou não. Os proprietários de residência de quarteirão não se constituem em grupo organizado, não unificam suas vontades, ao contratar nem no decorrer da prestação de trabalho, pois não se reúnem para deliberar e com freqüência nem se conhecem, tratando cada um diretamente com o vigia; por esse motivo a relação é exclusivamente civil”.

Dentre os requisitos para o exercício da profissão de vigilante está o prévio registro no Departamento de Polícia Federal (art. 17, Lei 7.102/83), sendo-lhe permitido usar o uniforme e portar arma somente quando em efetivo serviço (arts. 18 e 19). A arma permitida ao vigilante é o revólver calibre 32 ou 38 e cassetete de madeira ou de borracha, autorizado aos empenhados em transporte de valores também utilizar espingarda de uso permitido, de calibre 12, 16 ou 20, de fabricação nacional. 

A empresa que prestar serviço de segurança necessita obter autorização do Ministério da Justiça, por seu órgão competente ou mediante convênio com as Secretarias de Segurança Pública, bem ainda deverá comunicar à Secretaria de Segurança local. 

Considerando os riscos da atividade, a vigilância no transporte de valores só poderá ser executada (art. 3º, Lei 7.102/83): 

I – por empresa especializada contratada; ou 
II - pelo próprio estabelecimento financeiro, desde que organizado e preparado para tal fim, com pessoal próprio, aprovado em curso de formação de vigilante autorizado pelo Ministério da Justiça e cujo sistema de segurança tenha parecer favorável à sua aprovação emitido pelo Ministério da Justiça.

Para a prestação da vigilância ostensiva, além das empresas acima enumeradas, as Polícias Militares de cada Estado, a critério dos respectivos Governadores, poderão desempenhá-la, nos estabelecimentos financeiros estaduais. Com a privatização dos bancos públicos, o serviço da PM nos Estados ficou mais restrito, quanto a este aspecto. 

A teor de ser uma atividade diferenciada, com requisitos próprios e traços policialescos, a profissão de vigilante leva em consideração o risco que lhe é natural, incumbindo a este tipo de CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 35ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 143-144, anotações ao art. 62, CLT.Prof. Francisco Gérson Marques de Lima (fev/2013) trabalhador o poder de reação armada e de defesa do patrimônio e de pessoas, por meios coercitivos, inclusive mediante utilização de arma de fogo. As situações de combate não estão descartadas, sejam corporais sejam por meio de armas apropriadas e autorizadas. 

Enquanto se vive um período de achatamento salarial no Brasil, presencia-se, por outro lado, o aumento da criminalidade e da violência urbana, em que os trabalhadores são cada vez mais expostos. Em muitas situações, mais até do que o próprio tomador de seus serviços, o beneficiário direto, a sociedade, as empresas, as instituições bancárias, as indústrias, a Administração Pública etc. 

O Projeto de Lei (PL) original era específico para os vigilantes, mesmo porque era uma luta encampada por eles. O PL 1.033/2003, que resultou na Lei 12.740/2012, foi proposto pela senadora Vanessa Grazziotin, do PCdoB-AM. De sua emenda, lia-se: “Institui o salário adicional de periculosidade para os vigilantes e empregados em transporte de valores”.Por sua relevância e esclarecimento, transcrevem-se, a seguir, trechos da justificativa do referido PL:
“(...)
Importante, ainda, esclarecer que para fins da presente Lei são vigilantes e empregados em transportes de valores aqueles profissionais que se enquadrem nas disposições da Lei nº 7.102, de 20.6.1983, alterada pelas Leis nº 9.017 de30.3.1995 e 8.863 de 29.3.1994.

O próprio INSS já reconhece a profissão como atividade de risco notório,ao conceituar Guarda/Vigia/Vigilante:

"Pessoa contratada por empresas especializadas em vigilância ou transportes de valores ou pelo próprio estabelecimento financeiro, habilitada e adequadamente preparada, em curso de vigilante para impedir ou inibir ação criminosa que tem por obrigação funcional proteger o patrimônio de terceiros contra roubos, depredações e outros atos de violência, estando devidamente autorizado aportar e utilizar-se de arma de fogo no exercício da atividade de que trata este subitem, ficando em decorrência sua integridade física exposta a risco habitual e permanente." (Fonte: Rede Brasil Legislação Multimídia). 

Também o STJ proferiu decisão por unanimidade, em 13.8.2002, onde esta Corte, confirmando uma decisão do Egrégio TRF da 4ª. Região, entendeu serem os profissionais vigilantes beneficiários do tempo de serviço especial para os que atuam em situação de risco, mesmo a despeito da referida profissão não constar entre aquelas regulamentadas como perigosas pelo Decreto nº. 53.831/64.

Vejamos o teor da Ementa e do Voto vencedor do Relator:

“EMENTA – PREVIDENCIÁRIO. VIGILANTE. PORTE DE ARMA DEFOGO. ATIVIDADE PERIGOSA. ENQUADRAMENTO. DECRETO Nº. 53.831/64.ROL EXEMPLIFICATIVO. I –
Restando comprovado que o Autor esteve exposto ao fator de enquadramento da atividade como perigosa, qual seja, o uso de arma de fogo, na condição de vigilante, deve ser reconhecido o tempo de serviço especial, mesmo porque o rol de atividades consideradas insalubres,perigosas ou penosas, descritas naquele decreto, é exemplificativo e não exaustivo.II – Recurso Improvido.”

“O presente recurso não merece prosperar.

O recorrente alega que a profissão de vigilante não se enquadra no item 2.5.7. do Anexo Decreto nº. 53.831/64, que regulamenta as atividades especiais,enquadrando como perigosa as atividades de Guarda, Bombeiro e Investigador, sob o argumento de que estas funções são de caráter público e de defesa do público,enquanto aquela protege interesses privados.

Esta argumentação não procede, pois, como bem salientado pelo Tribunal de origem, “o elemento essencial ao reconhecimento da periculosidade capaz de qualificar a atividade de guarda como especial está presente nos autos. O documento citado noticia que o Autor realmente trabalhava usando arma de fogo calibre 38.”Prof. Francisco Gérson Marques de Lima (fev/2013)

Assim, restando comprovado que o Autor esteve exposto ao fator de enquadramento da atividade como perigosa, qual seja, o uso de arma de fogo, na condição de vigilante, deve ser reconhecido o tempo de serviço especial, mesmo porque o rol de atividades consideradas insalubres, perigosas ou penosas,descritos naquele Decreto, é exemplificativo e não exaustivo.

Destaco, a propósito, as palavras de Sérgio Pinto Martins sobre o tema:

“...Atualmente, a jurisprudência vem entendendo da mesma forma, dizendo que as atividades constantes do regulamento são exemplificativas e não taxativas.Provando o segurado que trabalha em condições perigosas, insalubres ou penosas,terá direito ao benefício.”
(RECURSO ESPECIAL Nº. 413.614 – SC (2002/0019273-0) –RELATOR: MINISTRO GILSON DIPP – RECORRENTE: INSTITUTO NACIONALDO SEGURO SOCIAL – INSS – RECORRIDO: 

PEDRO DUTKEVIS) – FONTE:página do STJ, internet, consulta realizada no dia 23.10.2002.
O presente posicionamento do Superior Tribunal de Justiça traz em seu bojo a essência da tese que sustentamos nesse projeto, ou seja, a condição para que a atividade laboral seja considerada como perigosa é a comprovação de que o mesmo esteve, ou está, exposto ao FATOR DE ENQUADRAMENTO como perigosa.

Ora, Excelências, tendo o Superior Tribunal de Justiça entendido que o fator de enquadramento é o elemento essencial para a definição das atividades perigosas, tendo este mesmo Colegiado Superior entendido que a exigência deporte de arma de fogo expõe os profissionais vigilantes ao fator de enquadramento das atividades perigosas, parece-nos um simples exercício de lógica jurídica, que,se os vigilantes tem sua atividade considerada perigosa para fins de aposentadoria especial, o tem para fins de recebimento do adicional de periculosidade.

Chegamos a tais conclusões num simples exercício de hermenêutica,onde as premissas fáticas e jurídicas de que a profissão de vigilante preenche o fator de enquadramento de atividade de risco, que é o labor com arma de fogo e a responsabilidade de defender, muitas vezes com a própria vida, o patrimônio alheio,num quadro de marginalidade crescente, nos levam às conclusões jurídicas de que a Constituição determinou a proteção a todas as atividades de risco, sejam com o direito a aposentadoria especial, já deferida pelo STJ, seja com o direito ao adicional de periculosidade.

Por fim, resta argumentar que o risco da atividade pertence ao mundo natural dos fatos e que a atividade do Recorrente é notoriamente perigoso, não só porque trabalha portando arma de fogo, mas também porque seu labor é proteger pessoas e patrimônio numa sociedade em crescente escala de violência.

É nesse sentido que apresentamos a propositura visando regulamentar o art. 7º, inciso XIII da Constituição Federal, incluindo a profissão de vigilante e empregados em transporte de valores entre aqueles que atuam em condições perigosas e têm o direito de receber o adicional de periculosidade.”(destaques no original).

Na esteira do que já foi reiteradamente dito nestas páginas, o PL 1.033/2003 se transformou na Lei nº 12.340/2012. De sua leitura, no entanto, fica bastante claro seu propósito e as razões que o justificaram. Sob o ponto de vista subjetivo, o profissional de que tratava, desde o início, era o vigilante. E fazia ênfase ao profissional encarregado do transporte de valores, certamente a mais perigosa das atividades de que tratava. Um perigo que salta aos olhos e encandeia, de tão reluzente. Talvez por isso mesmo ofusque alguns intérpretes. 

A redação do PL era enxuta, limitando-se a dizer:

“Art. 1º. Fica reconhecida como perigoso a atividade de vigilância ou de transporte de valores, passando o empregado que a exerce a ter direito a uma remuneração adicional de 30% sobre Prof. Francisco Gérson Marques de Lima (fev/2013) o salário que perceber, a título de adicional de periculosidade, a qual se incorpora ao salário para todos os efeitos legais.

Art. 2º. Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.”

Transformando-se o PL na Lei nº 12.740/2012, a ementa desta foi a seguinte: “Altera o art. 193 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, a fim de redefinir os critérios para caracterização das atividades ou operações perigosas, e revoga a Lei nº 7.369, de 20 de setembro de 1985.” A própria ementa da lei demonstra que, ao final, ela saiu mais ampla do que a pretensão inicial. Frise-se: mais ampla, e não mais restrita. A mens legis ampliou o sentido inicial, superando o projeto. 

E foi assim que a nova redação acabou sendo incorporada ao art. 193, CLT, com conteúdo genérico, amplo, sem restrições pontuais. Isto porque, na redação final, considerou como atividade de risco aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem perigo acentuado em virtude da exposição permanente do trabalhador a “II – roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial”. A abrangência acaba por permitir que outros profissionais, e não apenas os vigilantes, possam vir a ser classificados como trabalhadores que desenvolvam atividade de risco. E, aí, poder-se-ia acrescentar os porteiros de condomínio, alguns tipos de vigia, certos empregados domésticos, seguranças em geral (de boates e clubes festivos, p. ex.) etc. Muitas destas atividades requererão, de fato, uma regulamentação do Ministério do Trabalho e Emprego, ao que este articulista sugere seja escutado profissional técnico na área de segurança, senão a própria Polícia. Entretanto, a regulamentação deste inciso II, pelo MTE, está vinculada à constatação de risco profissional perante ação humana, risco de vida, e não à periculosidade tradicional. É uma nova modalidade, diferente em sua essência da perigosidade historicamente reconhecida pelo Direito. 

Do PL 1.033/2003, contudo, escapou o conteúdo que agora repousa no § 3º do art. 193, CLT: 

“Serão descontados ou compensados do adicional outros da mesma natureza eventualmente já concedidos ao vigilante por meio de acordo coletivo”. A razão deste parágrafo está em que, por meio de instrumentos coletivos de trabalho (Acordos e Convenções Coletivas), celebrados em várias localidades do Brasil, a categoria de vigilantes e, mais enfaticamente, os trabalhadores do setor de transporte de valores vinham obtendo adicionais de risco de vida. Conforme a localidade e o tipo de instrumento, esses adicionais eram variáveis, embora este autor desconheça que algum ultrapassasse 30% do salário. Com a nova disposição legal, tais adicionais serão levados em conta, para efeito de compensação. Assim, se o instrumento coletivo de trabalho estipulava adicional de risco de vida em 12%, enquanto a Lei prevê atualmente 30% do salário, as empresas alcançadas pela nova redação pagarão mais 18%, que é a diferença entre estes percentuais. 

Uma observação faz saltar do referido § 3º do art. 193, CLT: ele faz expressa menção a “vigilantes”. É claro que o termo alcança também os trabalhadores de transporte de valores, por força da classificação comum, dada pela Lei nº 7.102/83 e seu Dec. 89.056/83.

Regendo a profissão de vigilante, o Dec. 89.056/83 insere nesta categoria os empregados que laboram no transporte de valores, ao lume do preceituado nos artigos que seguem: 
“Art. 15. Vigilante, para os efeitos deste Regulamento, é o empregado contratado para a execução das atividades definidas nos incisos I e II, e § 2º, do art. 30, e no art. 31, caput, deste Regulamento.”

“Art. 30. São considerados como segurança privada as atividades desenvolvidas em prestação de serviços com a finalidade de: I - proceder à vigilância patrimonial das instituições financeiras e de outros estabelecimentos, públicos ou privados, e à segurança de pessoas físicas; II - realizar o transporte de valores ou garantir o transporte de qualquer outro tipo de carga.”

“Art. 31. As empresas que tenham objeto econômico diverso da vigilância ostensiva e do transporte de valores, que utilizem pessoal de quadro funcional próprio para a execução dessas atividades, ficam obrigadas ao cumprimento do disposto neste Regulamento e demais legislações pertinentes.”Prof. Francisco Gérson Marques de Lima (fev/2013)

E, se assim não fosse, a dicção legal oneraria demasiadamente as empresas, criando uma distinção sem sentido (vigilantes e empregados em setor de transporte de valores), além de admitir adicionais em patamar expressivo, como de 42%, de 50% etc., em face do somatório entre o percentual previsto em instrumento coletivo e aquele estabelecido pela reportada disposição legal. 

A outra conseqüência que a redação do parágrafo acarreta, ainda por se referir a “vigilantes”, é de que ela permite a referida compensação de imediato. E, por via de extensão,denota a sua auto-aplicabilidade, tema a ser dissecado em tópico seguinte deste artigo. 

Mas as empresas de vigilância ou outras prestadoras de serviços não pagarão o adicional de periculosidade (risco de vida) a todos os seus empregados, senão apenas aos vigilantes. É factível que sejam beneficiadas outras categorias de trabalhadores, desde que se encontrem em situação de risco, assim reconhecida pela regulamentação trabalhista (genérica) ou pela via judicial (específica). Empregados como porteiros, telefonistas, atendentes, contínuos, ascensoristas, serviços de portaria ou protocolo etc., não farão jus ao benefício, a não ser que provem a existência de trabalho sob condição de risco de vida, nos estritos termos do inc. II do art. 193, CLT. Caso já recebam adicional ou gratificação de risco de vida, por força de Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho, permanecerão percebendo o mesmo benefício, com o mesmo valor. A existência de instrumento coletivo poderá ser um indício de atividade de risco e auxiliar na classificação a ser feita pelo MTE ou em eventual discussão judicial na Justiça do Trabalho.

4. Normas de segurança e proteção à saúde dos trabalhadores

Nas negociações coletivas de trabalho, no Brasil, surgiu a “gratificação de risco de vida”, como forma pecuniária de compensar, em parte, os perigos da labuta dos vigilantes. O risco desta atividade provém de um elemento humano (assaltantes, meliantes, bandidos, seqüestradores etc.), externo à pessoa do trabalhador, e não de elementos químicos ou substâncias tóxicas com as quais ele lide (explosivos, inflamáveis, combustíveis, gases, toxinas, radiações etc.). Esta compreensão de agentes nocivos, a causar riscos (periculosidade e insalubridade), é que distingue a peculiaridade do trabalho dos vigilantes e outros empregados que desenvolvem atividade de risco, de um lado, e o trabalho qualificado como insalubre (art. 189, CLT) ou perigoso (art. 193, primeira parte, CLT), de outro. Apesar desta nítida diferença, o legislador inseriu as atividades desenvolvidas sob risco – por ações humanas – na categoria de perigosas (Lei nº 12.740/2012; atual art. 193, segunda parte, CLT). Certamente, assim o fez por vislumbrar a palavra no seu sentido genérico, comum, etimológico; e não no rigor técnico utilizado pelo Direito do Trabalho. 

Referida simplicidade ou atecnia, no entanto, causou confusão na interpretação da norma, sobretudo porque ela atinge direta e imediatamente o bolso dos envolvidos. A celeuma justificou, então, a elaboração deste breve artigo doutrinário. 

O inc. II, combinado com o § 3º, ambos do art. 193, CLT, sem nenhuma sombra de dúvidas se referem a vigilantes, em geral; e permitem que outros trabalhadores possam vir a ser beneficiados pelo mesmo adicional (inc. II). Logo, a regulamentação que o MTE fará, seja ela qual for, não poderá excluir os vigilantes, muito menos aqueles que laboram com transporte de valores. Ambos, com as considerações conceituais feitas neste estudo, já estão contemplados pela Lei. A Regulamentação que o MTE fará, quanto a eles, é de ordem protecional, estabelecendo cuidados e equipamentos que as empresas terão de fornecer a tais trabalhadores, por analogia com sua função de definir Equipamentos de Proteção Individual (EPI) e Equipamentos de Proteção Coletiva (EPC). Isso sem prejuízo do ônus pecuniário, no importe de 30% do salário, a título de adicional de periculosidade. O adicional está garantido legalmente aos vigilantes; não pode ser retirado pelo MTE, por meio de classificação restritiva. Admite-se, mesmo, que a normatização permitida venha em Anexo específico para os Vigilantes, como fez com os caixas de supermercados, os operadores de teleatendimento e telemarketing. 

Outros profissionais, não vigilantes, é que serão averiguados pelos estudos técnicos do MTE, para ver da corretude em classificá-los em atividades de risco ou não, a que se refere o inc. II, do art. 193, CLT,sob comento. De fato, quanto a eles há dúvidas reais sobre a periculosidade, cabendo ver a conveniência de se generalizar as conclusões a que os estudos cheguem neste particular. Aí, sim, justifica-se a NR vindoura do MTE. Contudo, mesmo quanto a estes trabalhadores, que venham a ser considerados em condições de risco de vida, caberá ao MTE estabelecer normas mínimas de proteção. É claro que se fará uso do bom senso na averiguação e determinação das atividades que sejam consideradas ensejadoras de risco de vida. O critério deve ser o real, o do risco iminente e ínsito à atividade, não se deixando levar pela mera possibilidade, remota, de o trabalhador vir a morrer por força do seu serviço. Afinal, como seres vivos, vivendo numa sociedade violenta e submetidos aos perigos da criminalidade, estamos todos sujeitos a situações de risco, dentro ou fora do trabalho. 

Com efeito, não basta a lei criar ou reconhecer o direito ao adicional de vida, sem que crie mecanismos de proteção aos trabalhadores. É que o pagamento do adicional não dá direito às empresas de expor seus empregados a risco de vida. Em outras palavras: não é pelo recebimento de 30% sobre o salário que, doravante, os trabalhadores poderão ser mortos e terão de arcar com todos os riscos da atividade, submetendo sua vida à criminalidade. O empresário não passa a ser o dono da vida do trabalhador, como se fosse um bem disponível e vendável. A proteção à vida não pode ser sacrificada por um adicional que não cobre todas as conseqüências de um acidente fatal ou que possa levar o trabalhador à invalidez. Seria desumano, para o trabalhador e para a família dele. 

Por isso, é válido e razoável sustentar que o MTE deva observar as cautelas e imposições já estabelecidas pela própria Lei nº 7.102/83, mas, complementarmente, determinará os EPIs e EPCs que as empresas deverão dispor aos trabalhadores, a exemplo do que sucede com todas as atividades insalubres e perigosas. E, aí, poderá incluir o uso de botas especiais (talvez antiderrapantes e adequadas ao solo); coletes à prova de balas (aperfeiçoando a Portaria 191/2006, MTE, subitem E.2 do anexo I da NR-6); cursos permanentes de qualificação profissional;material de composição e dimensões dos cassetetes (tonfas, bastões retráteis, não retráteis...); apitos e botões de pânico; uso de celulares com linha direta para a polícia ou setor competente da empresa, que possam ser usados com rapidez e eficiência em casos de emergência; especificação de polchetes e mochilas, inclusive porta-algemas; fardamento apropriado, conforme o setor; bonés específicos que evitem ou minimizem danos na cabeça; luvas para os motoristas de carros fortes e luvas táticas para outros serviços; óculos para evitar ofuscamento, quando o serviço for desempenhado ao sol;uso de aparelhos GPS; condições de salubridade e conforto dentro dos carros-fortes; níveis de tolerância da temperatura nos veículos; disponibilidade de paramédicos para atendimento rápido em situações de emergência; veículos adequados ao transporte emergencial de feridos à bala; etc.

É preciso municiar o trabalhador com instrumentos de proteção e, ao mesmo tempo, que lhe permita revidar, com segurança, os ataques em situação de conflito.

Com acerto, ensina Amauri Mascaro Nascimento: “As empresas tem uma finalidade social que as obriga a cumprir determinados objetivos, voltados para a sua total realização, que não se limita aos objetivos econômicos. Assim, na sua organização, devem estar presentes os meios destinados a esses objetivos, dentre os quais uma estrutura adequada para zelar pela segurança e higiene dos seus empregados. (...). Conforme o grau de risco e número de empregados, as empresas precisam ter um ou mais médicos, engenheiros, auxiliares de enfermagem e inspetores de segurança” (Iniciação ao Direito do Trabalho.25ª ed. São Paulo: LTr, 1999, p. 378-9).

Em defesa da saúde e segurança do trabalhador, as empresas precisam assumir a responsabilidade pelos riscos a que submetem seus empregados. Isto é matéria de ordem pública. E a prevenção tem uma relevância muito maior do que as medidas indenizatórias ou assistenciais, eis que a maioria dos danos e lesões correntes no setor de vigilância são irreversíveis, alguns sendo fatais. 

Os equipamentos táticos terão como parâmetro os utilizados pelos policiais, ressalvados os casos de permissão exclusiva às Forças Armadas e à Polícia. Alguns destes equipamentos já são utilizados por muitas empresas de segurança, cabendo ao MTE o importante papel de uniformizar o tratamento, aproveitando a experiência já existente no setor. Para as boas empresas, a oneração será mínima, porque não constituirá novidade para elas, que vem investindo nesses equipamentos; para as desleixadas ou sem investimento na área haverá a imposição pelo Estado, provavelmente com prazo para que se adeqüem às novas disposições regulamentares. 

Os cuidados com a ambiência de trabalho não diz respeito apenas às obrigações do empregador para com seus empregados, mas, também, dos tomadores dos serviços terceirizados, onde a labuta de fato se desenvolve. Arion Romita bem observou isso ao escrever: “A observância das normas de segurança e medicina do trabalho não se impõe apenas na relação jurídica entre a empresa e seus empregados. Estende-se às relações travadas pela empresa contratante e os empregados da contratada, no tocante a estes, quando ocorre a subcontratação (ou exteriorização dos serviços)”.

Embora os olhos dos trabalhadores e dos empregadores estejam voltados para o adicional de 30%, pela nítida repercussão imediatista, talvez a parte mais importante da alteração dada pela Lei nº 12.740/2012 esteja justamente na abertura que ela conferiu ao MTE para tratar da segurança do trabalhador. Um efeito reflexo, diga-se.De sua vez, o MTE precisará observar que o seu papel regulamentador não está apenas na definição de sujeitos a ser beneficiados pelo adicional, senão no tratamento de equipamentos de segurança dos empregados, a ser fornecidos pelos empregadores, e na estipulação de condições de trabalho. 

Cabe registrar, outrossim, que a Lei nº 7.102/83 e o Decreto nº 89.056/83, que a regulamentou, atribuem funções de fiscalização à Polícia, especialmente à Polícia Federal. As atribuições, aí, têm sido quanto à proteção das empresas envolvidas na prestação de serviços, são cautelas envolvendo segurança pública e proteção ao estabelecimento. São normas tímidas na proteção ao trabalhador, com pouca exigência de artefatos de segurança do trabalho. Contudo, a fiscalização propriamente trabalhista, aquela em que se verificam as condições de trabalho dos empregados, de higidez do ambiente e de prevenção de acidentes, é de incumbência constitucional dos órgãos do MTE (art. 21-XXIV, CF; Lei nº 10.683/2003, art. 27–XXI; Dec. 5.063/2004). Consequência natural é que a função de regulamentar a segurança e a saúde do trabalhador também é de competência do mesmo MTE, sem que isto implique invasão das atribuições de outros órgãos do Poder Público, respeitadas, pois, as competências de cada um (art. 22-I, CF; Lei nº 10.683/2003, art. 27–XXI;Dec. 5.063/2004). 

5. Aplicação imediata da Lei nº 12.740/2012:

A legislação do trabalho cuida de uma modalidade específica de direitos fundamentais: os direitos sociais. A hermenêutica que se lhes aplica é voltada a conferir eficácia plena e imediata à norma, sendo compromisso do aplicador da norma extrair-lhe o máximo grau de eficácia. Daí Sergio Victor Tamer haver sintetizado: “as normas que definem os direitos econômicos, sociais e culturais devem ser interpretadas no sentido de garantir-lhes aplicação imediata, gerando, desta forma, direitos para seus titulares”.

A vigilância ostensiva caracteriza-se exatamente por uma condição de revide às investidas criminosas. É o que dispõe o Dec. 89.056/83: “Art. 5º. Vigilância ostensiva, para os efeitos deste Regulamento, consiste em atividade exercida no interior dos estabelecimentos e em transporte de valores, por pessoas uniformizadas e adequadamente preparadas para impedir ou inibir ação criminosa.”

ROMITA, Arion Sayão. Direitos Fundamentais nas Relações de Trabalho. São Paulo: LTr, 2005, p. 379.

Emilio Betti atribui uma responsabilidade construtiva imensa ao intérprete, porque a lei precisa ser integrada na aplicação fática e “enriquecida mediante uma eficiente colaboração do intérprete”. Andreas Krell, dando eco a Ingo Sarlet, advoga que o art. 5º, § 1º, da Constituição Federal, impõe aos órgãos estatais a tarefa de maximizar a eficácia dos direitos fundamentais sociais e criar as condições materiais para a sua realização.

São lições que se aplicam perfeitamente ao caso abordado nestas páginas, as quais verificam a existência de norma apta a surtir efeitos financeiros imediatos (30% a título de adicional de risco de via, aos vigilantes). 

Ficou grafado no início deste apanhado doutrinário que a redação básica do caput do art. 193, CLT, não foi alterada. O espírito permaneceu exatamente o mesmo, a ponto de que as NRs atualmente existentes continuam em pleno vigor, com a mesma validez e eficácia. Deveras, a simples alteração na ordem das palavras de uma norma não afeta a regulamentação da redação antiga. A recepção das normas regulamentares é indubitável, justificando-se, ainda por cima, pelos primados da economia legislativa e da aplicação imediata e continuada dos direitos fundamentais, de que são espécies os direitos sociais, ramo a que pertencem os direitos trabalhistas. Portanto, a recepção das normas regulamentadoras pela nova disposição legal é a consagração destes princípios, havendo mera mudança no fundamento de validade, sem nenhuma perturbação de mérito legislativo.

Destarte, por exemplo, a remissão a “na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego”(caput do art. 193, CLT) continua sendo necessária, conquanto seu destino seja, muito mais, enfocar as questões técnicas, aquelas que requerem conhecimento específico, científico, como a definição de substâncias tóxicas, a aquilatação do que seja mais ou menos ofensivo à saúde humana, a regulamentação do que seja inflamável, o tipo de material operacional, os equipamentos e cuidados técnicos a ser observados, a periclitância ou riscos causados conforme o manuseio de cada substância química etc. São conhecimentos que somente engenheiros, médicos, químicos e outros profissionais com conhecimento especializado podem esclarecer. Portanto, a letra da lei tem íntima pertinência com o inc. I do art. 193, CLT.Se a nova disposição legal houvesse suprimido a referida menção, acarretaria um caos imenso, pois remeteria à jurisprudência a definição do que fosse atividade insalubre, periculosa e no setor de energia elétrica. E, como se sabe, há muita jurisprudência divergente nos mais diversos assuntos. 

Este seria mais um deles. O número de perícias judiciais aumentaria sensivelmente, causando prejuízo para a tutela jurisdicional. 

Então, parece claro que o condicionamento à regulamentação pelo MTE se refere ao inc. I do atual art. 193 da CLT, dando continuidade ao que já existia no ordenamento jurídico antes da Lei nº 12.740/2012, pelo que permanece de plena aplicação nos termos das respectivas NRs. E, quanto ao inc. II, refere-se:(a)à indicação dos equipamentos de proteção e à condição de trabalho aos vigilantes, que devem ser regulamentados; e(b)à definição de quais outros profissionais se sujeitarão à nova disposição legal. 

TAMER, Sergio Victor. Atos Políticos e Direitos Sociais nas Democracias: um estudo sobre o controle dos atos políticos e a garantia judicial dos direitos sociais. Porto Alegre: SAFE, 2005, p. 207.

BETTI, Emilio. Interpretacion de la ley y de los actos jurídicos. Madrid: Editoriales de Derecho Reunidas, 
Castelló, 1971, p. 123.

KRELL, Andreas J. Direitos Sociais e Controle Judicial no Brasil e na Alemanha: os (des)caminhos de um 
direito constitucional “comparado”. Porto Alegre: SAFE, 2002, p. 38.

No plano constitucional, analogia juris, extrai-se a seguinte lição, na defesa da aplicação imediata dos direitos fundamentais/sociais, cujo tirocínio é idêntico ao ora sustentado: “Assim, salvo rara exceção, onde o preceito não se reporta ou remete à lei, é auto-aplicável. E quando remete à lei e esta já existe, agora com novo fundamento de validade, aparadas as arestas de conflito com a Constituição, passa a ser a lei regulamentadora, dando eficácia social imediata ao Texto Maior” (LIMA, Francisco Meton Marques. Elementos de Direito do Trabalho e Processo Trabalhista. 12ª ed. São Paulo: LTr, 2007, p. 35).

Cuide-se que o art. 200, CLT, é claro: “Cabe ao Ministério do Trabalho estabelecer disposições complementares às normas de que trata este Capítulo...”.

O Capítulo indicado é o V, intitulado “Da Segurança e Medicina do Trabalho”, abrangendo os arts. 154 a 223, alguns dos quais revogados por leis que se seguiram no decorrer dos anos. O poder regulamentar, no âmbito trabalhista, é justificado por Gabriel Saad nos seguintes termos:
“se, de ordinário, a lei não logra apreender todas as relações interindividuais que interessem ao mundo jurídico, no caso da segurança e medicina do trabalho o problema se alarga e se agrava. É que a tecnologia, mercê dos rápidos progressos da ciência, quase que diariamente engendra novos processos de produção, idealiza outros equipamentos e utiliza nos manufaturados, materiais e substâncias que se convertem em outros tantos agentes agressivos e nocivos à saúde do trabalhador. Por essa razão, é usual em todos os países do mundo que, em relação ao assunto que vimos tratando, recebe o Poder Executivo poderes muito amplos para regulamentar normas legais voltadas para a saúde ocupacional”.

Tenha-se, porém, que a atividade permitida pela CLT à autoridade do trabalho é complementar à lei, o que significa dever obediência às disposições legais, sem atropelar a hierarquia normativa. A autoridade administrativa pode até estabelecer normas técnicas que aprimorem a lei, tendo em vista o objetivo maior, a proteção à saúde e segurança do trabalhador.

Contudo, não pode esvaziar o sentido da norma que lhe seja superior.Fundamentando esta característica da atividade regulamentar, José dos Santos Carvalho Filho sustenta:
“O fundamento não é difícil de conceber: incapaz de criar a regulamentação sobre algumas matérias de alta complexidade técnica, o próprio Legislativo delega ao órgão ou à pessoa administrativa a função específica de instituí-la, valendo-se dos especialistas e técnicos que melhor podem dispor sobre tais assuntos. Não obstante, é importante ressaltar que referida delegação não é completa e integral. Ao contrário, sujeita-se a limites. Ao exercê-la, o legislador reserva para si a competência para o regramento básico, calcando nos critérios políticos e administrativos, transferindo tão-somente a competência para a regulamentação técnica mediante parâmetros previamente enunciados na lei.”

A propósito do citado inc. II, acrescentado ao artigo 193, CLT, algumas considerações devem ser tecidas, envolvendo a aplicabilidade da lei. A discussão gira, precisamente, em torno das teses sobre o momento de sua eficácia, quer dizer, da sua real aplicação. A tese empresarial, resumidamente, cinge-se à menção à regulamentação pelo MTE, que, por se encontrar no caput do art. 193,condicionaria ambos os incisos; e, enquanto não houver a dita regulamentação, por norma própria, o dispositivo teria sua eficácia contida. Já a interpretação dada pelos sindicatos de vigilantes é de que a norma determinou a sua aplicação imediata, quando disse que “esta lei entra em vigor na data de sua publicação”. Tendo a lei sido publicada no DOU de 10.12.2012, nesta data deveria ter sido aplicada, encontrando-se as empresas recalcitrantes em débito desde então.

Embora o poder regulamentar seja próprio do Chefe do Executivo, que deve exercê-lo por meio de Decreto, o legislador trabalhista atribuiu ao Ministro do Trabalho este poder, em matéria de medicina e saúde do trabalho. Entre os seus limites, Diogenes Gasparini aponta os de ordem legal, que impede à autoridade dispor mais do que a lei permite (Direito Administrativo. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 123). No mesmo sentido: MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 33ª ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 182.

SAAD, Eduardo Gabriel; SAAD, José Eduardo Duarte; BRANCO, Ana Maria Saad C. CLT. 40ª ed. São Paulo: LTr, 2007, p. 276, anotações ao art. 200. 

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 53-54.

Há pressão social para que o MTE regulamente logo a matéria. Em 17.01.2013, por exemplo, o parlamentar Chico Vigilante se reuniu com o Ministro do Trabalho, deste extraindo o compromisso de conferir urgência à matéria. Ali, cogitou-se da possibilidade de o Ministro da Justiça regulamentar os seguimentos de segurança privada no país, inclusive pela via de Medida Provisória. Durante o dia 01/02/2013, os vigilantes realizaram paralisação nacional de protesto contra a resistência empresarial em pagar o adicional de 30% sobre os salários. Bancos fecharam as portas, algumas lojas encerraram as atividades do dia e houve grande repercussão em todo o país, inclusive afetando o funcionamento de repartições públicas. Ora, veja-se, a título exemplificativo: se vários bancos encerraram cedo o expediente e houve comprometimento do serviço público, em razão da falta de segurança, fica demonstrada a essencialidade do serviço de vigilância para o setor e sua íntima relação com a segurança de clientes, de administrados, de entidades públicas e de empresas. Vale dizer, instituições públicas e privadas não funcionaram ou funcionaram apenas em parte, com receio da marginalidade, procurando evitar assaltos e outras violências, pois não estavam, ali, os vigilantes para proteger as empresas nem as repartições públicas. Claro que quem se submete à violência potencial da criminalidade corre risco de vida.
Portanto, há urgência no trato da matéria, sendo nítido o interesse social.

De antemão, é de se adiantar que, para efeitos trabalhistas, não há necessidade de se aguardar uma nova lei ou medida provisória que regulamente os segmentos do serviço de vigilância privada. A Lei nº 7.102/83 já existe, disciplinando tais atividades e cuidando do profissional vigilante. Soa temerário que, justamente quando estes trabalhadores, definidos pela legislação em vigor, obtenham o direito ao adicional de periculosidade, numa luta árdua, desenvolvida por anos a fio, apareça a tese de que a lei precise ser alterada. É nítido o risco de, efetivamente, alguns segmentos da atividade de vigilante serem classificados de outra forma (talvez, como “vigias”, atividades não perigosas) e, assim, perderem o direito antes mesmo de usufruí-lo. Tal mudança poderia ser questionada judicialmente para assegurar a extensão de direitos, considerando a real situação de igualdade, em razão do risco de vida, e a imoralidade cometida pelo legislador. Mas, obviamente, não é esta a medida mais adequada. 

Constatada a necessidade de alteração da Lei nº 7.102/83, deve ela se dar no plano da regulação da atividade das empresas, das exigências do Estado quanto ao seu funcionamento, da fiscalização do Poder Público, do controle administrativo. Porém, não no plano trabalhista em si, até porque ofenderia a ética legislativa alterar o sentido da Lei nº 12.740/2012, para esvaziá-la, mesmo que por via transversa, isto é, modificando a toque de caixa a Lei nº 7.102/83.

A Lei nº 12.740/2012se expressou mal, quando inseriu nas atividades periculosas aquelas desenvolvidas pelos vigilantes. Na verdade, o adicional que criou foi adicional de risco de vida, cuja natureza do serviço não exige nenhum conhecimento técnico de verificação, ao contrário das atividades insalubres e perigosas. De fato, é bastante ver um vigilante em atividade para que se constate, de logo, o risco inerente ao seu trabalho. Qualquer leigo (critério do homem médio)pode, perfeitamente, ver e atestar isso, sem precisar ter conhecimento técnico especializado, seja saber química, engenharia, farmácia, medicina etc. A constatação é feita muito facilmente, bastando um simples olhar ou conhecer o ofício dos vigilantes. De longe se avista a situação de risco acentuado. Por sinal, este primeiro viso já foi feito pelo legislador, que constatou o risco evidente a todos os vigilantes e lhes acrescentou ao salário o adicional mínimo de 30%. Adicional mínimo, repita-se, porque ele poderá ser maior se houver negociação coletiva.

A constatação realizada pelo legislador, antecipada à autoridade administrativa, escudou-se na experiência prática, no que se vê todos os dias, no perigo que os profissionais enfrentam diariamente. Não pode, portanto, nenhuma outra autoridade pública, administrativa ou judiciária, nem empregados, empregadores ou sindicatos, negar, por qualquer meio, a demarcação legislativa, que é de cunho imperativo e não admite renúncias. Negar que a atividade de vigilante não é perigosa seria desconsiderar os poderes constitucionalmente assegurados ao legislador. A única maneira de afastar, formalmente, a validade da lei é a declaração de inconstitucionalidade, vício do qual não padece a redação atual do art. 193, CLT. Enfim, a verificação de periculosidade já foi feita pelo Legislativo, previamente à autoridade administrativa, por meio de lei, que é superior às normas das autoridades encarregadas de regulamentá-la. Logo, qualquer regulamentação que fira, mesmo que indiretamente, a consagração realizada pelo legislador será eivada de vício de validade, por ofensa à hierarquia normativa, não terá nenhum respaldo jurídico, cabendo ao Judiciário afastar a norma regulamentadora pela via do controle concentrado ou do controle difuso de constitucionalidade. 

A expressão “risco de vida” acabou suplantando a expressão mais correta, que era “risco de morte”, em razão do uso contínuo da linguagem cotidiana.

Outro caminho para invalidar a norma regulamentadora seria a sua sustação pelo Congresso Nacional, nos termos do art. 49-V, da Constituição Federal.

Diga-se mais: em razão da violência e dos altos índices de criminalidade que enlameiam o país, o risco de vida é presumido à atividade dos vigilantes, por ser ínsito à natureza do serviço. 

Afigura-se, mesmo, que a presunção, neste caso, é absoluta, e não relativa. Vale dizer: não se admite que a empresa busque provar que a atividade de determinado vigilante não seja perigosa. 

A presunção só pode ser desfeita mediante prova cabal do empregador no sentido de que, na realidade, o profissional não seja vigilante e, portanto, não esteja abrangido pelo âmbito subjetivo da lei. Então, será invocável o princípio da primazia da realidade, que norteia todo o Direito do Trabalho. No campo judicial, nas Reclamações Trabalhistas, sempre haverá a possibilidade de se verificar, concretamente, independentemente da regulamentação a ser feita pelo MTE, se o trabalhador não vigilante se encontra na situação de perigo descrita na lei; e, por conseqüência, se faz jus ou não ao adicional de risco de vida, quer dizer, de periculosidade. 

O PL 1.033/2003 se referia expressamente aos profissionais vigilantes e não condicionava sua aplicação a nenhuma regulamentação subsequente. Deste modo é que transitou nas várias instâncias do Legislativo, até receber a sanção Presidencial.E, por questão de ênfase, fazia expressa menção, ainda, aos trabalhadores no serviço de transporte de valores. 

Tanto assim, a ementa do projeto dizia: “Institui o salário adicional de periculosidade para os vigilantes e empregados em transporte de valores”. Outro fator para a utilização desta expressão é que, em muitos Estados, a categoria possui sindicatos diferentes, sendo que uns representam os vigilantes em geral e, outros, são específicos para os trabalhadores de transporte de valores.Para a Lei nº 7.102/83 e o Dec. 89.056/83, porém, os empregados considerados vigilantes são gênero, de que são espécies os responsáveis por transporte de valores (veja-se nota de rodapé, em página anterior). 

E é isto que explica a redação genérica do § 3º do art. 193, CLT: “Serão descontados ou compensados do adicional outros da mesma natureza eventualmente já concedidos ao vigilante por meio de acordo coletivo”. Constate-se: a redação final da lei não diferenciou os vigilantes (sentido amplo) dos empregados em transporte de valores (vigilantes com atribuições específicas). 

A referência a periculosidade, aí grafada (art. 193, CLT), é no sentido amplo, de perigo, considerando a existência de um elemento de risco (a violência física) contra a vida do trabalhador. E, ao reportar-se, especificamente, ao serviço de transporte de valores, o PL pretendia acentuar o grau de risco a que estes profissionais estariam submetidos, por se encontrarem mais expostos a roubos, a assaltos e outros atentados. A rigor, a almejada diferenciação era desnecessária: primeiro, porque os trabalhadores de transporte de valores são, igualmente, vigilantes, regidos pela mesma Lei nº 7.102/83 e Dec. 89.056/83; segundo, porque o adicional de periculosidade é um só (30%), não havendo grau ou progressão em percentuais a diferenciar os vários tipos de serviço que o vigilante desenvolve. É diferente, portanto, das atividades insalubres, as quais dão margem a adicionais diferenciados (10%, 20% e 40%, art. 192, Prof. Francisco Gérson Marques de Lima (fev/2013) CLT), conforme a dimensão da capacidade de dano à saúde que o produto ou a atividade acarrete ao trabalhador. 

Transcreva-se novamente o art. 193 da CLT, destacando-se mais um aspecto: “Art. 193. 
São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude da exposição permanente do trabalhador a: (...)”.

A exposição ao perigo a que os vigilantes se encontra é, obviamente, de caráter permanente, enquanto ele se encontra de serviço. Pode ser que haja momentos de maior e de menor tensão, de perigo mais evidente e de menos potencial de risco. Porém, a permanência do risco é uma realidade constante, não tendo a lei considerado a oscilação do tamanho dos riscos.

Outro ponto é que dois fatores definem as atividades como sendo perigosas: (a) por sua natureza; e (b) pelos métodos de trabalho. Quem se encontrar em uma destas condições estará desempenhando atividade de risco. 

No caso dos vigilantes, é da natureza da atividade o risco de vida. É este o critério que define seu serviço, e não o segundo(“métodos de trabalho”). É que, independentemente da forma como o serviço seja prestado, do método empregado, ele será sempre arriscado, perigoso. Outros profissionais que não desempenhem atividade de risco por sua “natureza” podem vir a ser qualificados na mesma situação, em razão dos métodos de trabalho que desenvolvam ou a que estejam submetidos. 

O legislador antecipou-se a qualquer regulamentação e definiu que a atividade do vigilante é perigosa, por sua natureza. Esta é a interpretação que se faz a partir da tramitação do PL 1.033/2003, cujos trechos foram transcritos neste estudo, de onde se verifica que seu propósito era afirmar a condição de perigo permanente em que vivem os vigilantes.

A vontade do legislador (mens legislatoris) salta evidente, em tempo ainda muito recente e contemporâneo, sua memória não se perdeu, continua atual, de indubitável extração.

De fato, conviver com o perigo é da essência desta profissão. Descaracterizar o que o legislador já constatou e afirmou, seria suprimir a voz do Estado democrático e romper o primado da separação dos poderes. Esta inteligência é corroborada com a autorização para compensação de adicional de risco de vida, assegurado em instrumentos coletivos de trabalho aos vigilantes (§ 3º, art. 193, CLT). 

Em muitas ocasiões, por motivos técnicos e científicos, o legislador delega à autoridade administrativa poderes para que ela defina se determinadas atividades são consideradas perigosas ou desenvolvidas sob risco. São situações em que falta ao legislador conhecimento técnico suficiente para estabelecer regra geral em norma abstrata. Porém, no caso dos vigilantes, o próprio legislador se sentiu seguro de tipificar a atividade como sendo de risco. E o fez de fato, acolhendo reivindicação concretizada no PL 1.033/2003, que era específico para esta categoria. 

A incursão histórica, feita na verificação do processo legislativo, torna-se imprescindível para compreender a opção feita pelo legislador, no aclaramento do sentido e do alcance da norma. É um método de interpretação válido e útil na hermenêutica. No âmbito constitucional, destaca-se um método semelhante, que investiga a tramitação legislativa e fatores político-sociais que tenham contribuído para a elaboração da norma: o originalismo, que perdera a relevância que já ostentou outrora, especialmente no direito norte-americano, tendo sido resgatado de forma crítica mais recentemente. Enfim, o recurso a este método hermenêutico ainda apresenta uma muita importância, servindo para compreender a origem e as razões da norma. 

O STF tem recorrido a este método, a exemplo dos seguintes julgados: STF/2ª T., HC 00686877/130, Rel. Min. Carlos Velloso, in Revista LTr,56(06):675, Jun. 1992;STF/Pleno, CC 6979-1-DF, Rel. Min. Ilmar Galvão, in Revista LTr, 57(04):440, abr. 1993.
As dificuldades em se aplicar o método hermenêutico meramente histórico não se aplica à Lei nº 12.740/2012, porque a vontade do legislador é de fácil apreensão, não existe distância temporal entre a edição da lei e sua aplicação e porque é socialmente necessário que o intérprete lhe dê eficácia, colaborando com o intuito da própria norma, remetendo seus efeitos positivos para o futuro. Sobre esta discussão, recomenda-se a leitura de Carlos Maximiliano. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 13ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993, p. 18 e ss.

Ora, se a autoridade administrativa não pode tipificar de modo diferente a atividade do vigilante, senão como sendo de risco, obviamente a lei é auto-aplicável neste ponto. É que a regulamentação não pode apenas repetir a lei, pois isso significaria atividade inócua da administração, eis que nada acrescentaria; e, de seu turno, não pode contrariar a norma que lhe é superior, pois não teria validade alguma. Em ambas as situações, o raciocínio converge para a aplicação imediata da lei, cuja clareza dispensa normas complementares quanto ao sujeito definido (vigilantes). 

Henrique de Carvalho Simas, tratando da referência que a lei eventualmente faz a regulamento que a complemente, esclarece: “Poderá, entretanto, a lei entrar em vigor se, apesar de que o legislador tenha previsto um regulamento, houver possibilidade da sua aplicação sem aquele regulamento”.17 No caso do presente estudo, não há nenhum empecilho em se aplicar o art. 193, CLT, aos vigilantes, quanto ao cabimento do adicional de risco de vida. Afinal, o que a norma regulamentadora poderia criar de novo ou o que ela precisa esclarecer sobre o assunto? 

Simplesmente nada. 

Propositalmente, o PL 1.033/2003 não fazia qualquer referência à necessidade de regulamentação, da qual não necessitava. E não o fazia porque, na realidade, ele já seria a própria regulamentação da Constituição Federal, cujo art. 7º, XXII, dispõe como direitos dos trabalhadores urbanos e rurais: “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”.

A situação atual se parece com a novidade trazida, em 1988, pela Constituição Federal, então recém promulgada, ao estabelecer no rol de direitos dos trabalhadores “aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei” (art. 7º, XXI). 

Era óbvio que a proporcionalidade apregoada dependia de lei específica, que cumpriria o papel regulamentador da Constituição, o que só ocorreu por meio da Lei nº 12.506/2011. Contudo, cedo a doutrina e a jurisprudência definiram que o dispositivo constitucional tinha aplicação imediata quanto ao aviso prévio mínimo de 30 dias, afastando de logo o art. 487-I, CLT, que dispunha diferente para quem recebesse salário por semana ou inferior. O raciocínio da doutrina, corroborada pela jurisprudência, sustentava-se em duas razões: (a) no recurso ao princípio da aplicação imediata dos direitos fundamentais, de que são espécies os sociais; e(b) se o legislador ordinário não poderia estabelecer ao aviso prévio prazo inferior a 30 dias, porque necessariamente tinha de regulamentar uma proporcionalidade superior ao trintídio, então não tinha sentido suspender a aplicação da norma, por uma interpretação que contrariaria a ordem dada pelo constituinte ao legislador – seria negar eficácia a direitos fundamentais. Uadi Lammêgo Bulos defendia, na simplicidade que o comentário ao inc. XXI do art. 7º, CF, permitia: 

“Registramos que o inciso em epígrafe possui eficácia contida no que concerne à proporcionalidade ao tempo de serviço. Porém, no tocante ao prazo mínimo de trinta dias, o preceito está apto para surtir efeitos plenos. Assim, ficou derrogado o prazo de oito dias, disposto no art. 487, I, da Consolidação das Leis do Trabalho, para os empregados que recebem remuneração semanal ou de periodicidade inferior”.

SIMAS, Henrique de Carvalho. Manual Elementar de Direito Administrativo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1978, p. 79, tópico 152.

BULOS, UadiLammêgo. Constituição Federal Anotada. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 452, anotações ao inc. XXI do art. 7º. E Mozart Victor Russomano, logo após a CF/88, anotava que, em razão da disposição constitucional, “sejam quais forem os critérios de fixação do prazo do aviso prévio em função do tempo de serviço do empregado, ele nunca poderá ser inferior a trinta dias” (Comentários à CLT. 13ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1990, vol. I, p.586, comentando o art. 487). Idem: MANUS, Pedro Paulo Teixeira. CLT – Consolidação das Leis do Trabalho. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 127, anotando o art. 487; NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 25ª ed. São Paulo: LTr, 1999, p. 471.

Não há, postas estas razões, nenhuma razão ou justificativa para que se negue a aplicação do art. 193, CLT, imediatamente aos vigilantes, assim definidos pela Lei nº 7.102/83. 

Outros profissionais, contudo, poderão ser incluídos nesta previsão normativa. Porém, a inclusão dependerá da regulamentação que o MTE vier a disciplinar, caso constate que a atividade seja desenvolvida sob risco de violência física ou roubo, nos serviços de segurança pessoal ou patrimonial.

6. Medidas para assegurar o cumprimento imediato do art. 193, CLT, e as negociações coletivas:

Estando a lei em vigor, cumpre à sociedade lhe dar cumprimento. Cabe aos interessados adotarem as providências para obrigar os recalcitrantes a cumpri-la. Primeiro pela via do entendimento direto, da negociação; depois, pela via administrativa; e, enfim, pela via judicial.
Isto não significa que haja um caminho a seguir, nesta ordem, pois os interessados poderão se valer de quaisquer destas opções ou começar pela última delas. Mas, se as partes não se entenderem, o Estado deve ser chamado para resolver o conflito. 

As empresas que explorem a atividade de vigilância encontram-se em débito salarial dos vigilantes desde a publicação da Lei nº 12.740/2012 (DOU de 10.12.2012). O § 3º do art. 193, CLT, permite, de toda sorte, a compensação dos adicionais que os trabalhadores já percebam a título de gratificação de risco de vida (ou nome semelhante). Cabe às empresas interessadas se entenderem com as entidades ou repartições públicas tomadoras de seus serviços, a fim de buscarem o reequilíbrio contratual. Mas, deixe-se claro, esta responsabilidade não pertence aos trabalhadores; ela é inerente à atividade empresarial, que assume os riscos do empreendimento (art. 2º, CLT). Cabe aos sindicatos, a cada um dos trabalhadores e outros interessados promoverem as Reclamações Trabalhistas na Justiça do Trabalho, no local da prestação de serviço, demandando o pagamento das referidas diferenças salariais, com efeitos retroativos à publicação da Lei referida.Além da cobrança salarial, os Reclamantes poderão pedir que a Justiça determine às empresas que incluam o adicional na folha dos seus empregados, de forma permanente.

Nada impede, porém, que os sindicatos e as empresas negociem as diferenças salariais ou o modo de pagamento dos importes retroativos e meses de referência, com títulos vencidos e vincendos, a fim de tornarem eficaz o dispositivo legal e ajustarem a situação transitória às condições financeiras da empresa. Sem negociação coletiva, o caminho será o pagamento integral, na forma coercitiva que a Justiça do Trabalho venha a viabilizá-lo. Outro caminho para encaminhamento de solução do impasse é a demanda ao Ministério Público do Trabalho, que poderá auxiliar as partes em negociação coletiva ou estabelecer Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), a ser firmado pelos responsáveis. Sob a ótica deste doutrinador, o MTE já pode fiscalizar e começar a autuar as empresas que se encontrarem em mora salarial, sem necessidade de observar o critério da dupla visita.

Nem tudo, todavia, soará bem para o trabalhador, que se encontra eufórico com o adicional de 30% sobre os salários – um valor significativo, que contribuirá em muito para o planejamento familiar. É que vem aí a negociação coletiva da categoria, sendo o reajuste salarial uma das principais cláusulas da pauta. A reclamação do empresariado não terá tamanho– em 2013 e nos anos imediatamente seguintes – , pois argumentará que não terá condições de arcar com um reajuste considerável, em qualquer ponto acima da inflação; despontará o fundamento de que as empresas estarão sacrificadas por “aumentos” salariais (30% + reajuste). Cabe aos sindicatos atentarem para o discurso e evitar que o adicional de 30%, pagável a título de risco de vida, seja “engolido” pelas negociações vindouras, funcionando como uma bigorna a achatar outras conquistas. Também, os sindicatos precisarão manter canais de entendimento entre entidades afins, pois a conquista do adicional de 30% sobre o salário dos vigilantes poderá comprometer direitos negociais de outros trabalhadores que, embora exercendo funções diferentes (e, por isso, pertençam a outras categorias), sejam empregados de empresas de vigilância. As entidades sindicais não podem permitir compensações entre conquistas sociais de uns e perdas coletivas de outros, sejam entre direitos ou entre categorias. 

Embora a lei tenha aplicação imediata em alguns pontos, reconhece-se, contudo, que é de bom alvitre que o MTE, dentro de suas várias atribuições relevantes,dê prioridade na regulamentação do que seja necessário e permitido à matéria. Deveras, a autoridade administrativa deverá disciplinar sobre as condições de trabalho, de saúde e segurança dos vigilantes (não à questão do cabimento do adicional, direito já antecipado, esclarecido e assegurado pelo legislador), pois se trata de determinação da lei, constituindo interesse público.

Urge cuidar de esclarecer, também, outras situações abrangidas pela periculosidade a que se refere a nova redação do art. 193, CLT.A eventual omissão na regulamentação desafia ajuizamento de ações, inclusive o mandado de injunção na Justiça do Trabalho (TST), por força do art. 105, I-h, CF. Para corroborar a tese competencial, invoca-se a Súmula 736-STF: “Compete à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores”.

7. Conclusões:

A título de conclusões, pode-se resumir este estudo nas seguintes afirmações, louvando o alcance social da Lei nº 12.740/2012, conquanto reconhecendo as falhas que causou à redação do art. 193, CLT:

Reconhece-se que a simples inserção do conteúdo do PL 1.033/2003 ao art. 193, CLT, pela Lei nº 12.740/2012, trouxe dúvidas e ampliou a nova disposição, estabelecendo mais uma modalidade de atividade perigosa, levando o adicional de 30% aos trabalhadores que desenvolvam atividades sob acentuado risco permanente de roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial. 

O condicionamento à regulamentação pelo MTE, contido no caput do art. 193, CLT, refere-se ao inc. I do mesmo artigo (exposição a inflamáveis, explosivos ou energia elétrica), dando continuidade ao que já existia no ordenamento jurídico antes da Lei nº 12.740/2012, pelo que permanece de plena aplicação nos termos das respectivas Normas Regulamentadoras. E, quanto ao inc. II, o dispositivo deve ser interpretado no sentido de referir-se: (a)à indicação dos equipamentos de proteção e à condição de trabalho aos vigilantes, que devem ser regulamentados; e (b)à definição de quais outros profissionais se sujeitarão à nova disposição legal, também com especificação de normas preventivas de acidentes e que assegurem a higiene, a segurança e a saúde destes trabalhadores.

Há um ponto em que o referido inc. II (art. 193, CLT) é auto-aplicável. É que a atividade desenvolvida pelos vigilantes, assim disciplinados pela Lei nº 7.102/83, é naturalmente perigosa, não sendo necessária nenhuma regulamentação posterior para que tais trabalhadores tenham direito ao adicional de periculosidade (adicional de risco de vida). Desde sua publicação, a Lei nº 12.740/2012 está em vigor, ficando autorizada a compensação de outros adicionais que os vigilantes percebam, a este título, por força de instrumento coletivo de trabalho. Portanto, as empresas do setor encontram-se em débito salarial, cabendo providências individuais e coletivas. 

Para o cumprimento da lei, os interessados (trabalhadores, grupos de empregados e sindicatos) poderão promover Reclamações Trabalhistas, pedindo à Justiça do Trabalho da localidade da prestação de serviços que obrigue a(s) empresa(s) a pagar(em) o débito salarial, desde a publicação da Lei nº 12.740/2012, observando-se a compensação pecuniária com os valores já recebidos a título de adicional/gratificação de risco de vida. Além da cobrança, as empresas podem ser demandadas com obrigação de incluírem o adicional em folha dos seus empregados. 

Este, portanto, é o contributo deste autor à matéria, cuja complexidade se quer dar maior do que ela realmente é. 

Referências bibliográficas:

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Autor: Francisco Gérson Marques de Lima
Enviado por: Silvio Salustiano