domingo, 24 de abril de 2011

Integração de escola e comunidade é fundamental para conter violência, defendem especialistas


Representantes de diversas instituições ligadas à educação infantil avaliaram que o combate à violência nas escolas requer medidas que vão além do aumento da segurança nas instituições de ensino. Para especialistas, umas das medidas seria a integração da comunidade à rotina escolar. O debate sobre o tema ocorreu nesta segunda-feira,18, na Comissão de Direitos Humanos do Senado.

A reunião já estava agendada quando ocorreu, há quase duas semanas, o assassinato de 12 crianças na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo (RJ).

"Não consigo enxergar que se combata a violência trancando mais ainda as escolas. Isso não resolve. O melhor caminho é o contrário: a comunidade se integrar ao processo escolar", afirmou o representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) Antônio de Lisboa Vale.

Ele destacou que não existe qualquer "solução milagrosa" para esse problema. Entretanto, afirmou que de imediato é importante que os dirigentes escolares estimulem o uso de seus espaços pela comunidade para a promoção de ações de lazer e cultura. Outro ponto destacado pelo representante da CNTE foi a necessidade de qualificação dos profissionais que atuam na segurança das escolas para lidar com a violência estudantil.

Uma das diretoras do Sindicato dos Professores do Distrito Federal (Sinpro/DF) Rosilene Correa ressaltou que a violência na escola não será resolvida sem que o Estado entenda "de uma vez por todas" que destinar mais recursos para a educação não é gasto, mas investimento. "Nós, da nossa geração, temos que pedir desculpas às crianças e adolescentes de hoje por não termos sabido entregar uma escola pública melhor."

Outro ponto destacado por Rosilene Correa é que os professores são preparados para o ensino pedagógico, mas não têm preparo para lidar com a violência escolar. Ela afirmou que, caso o agravamento da violência entre estudantes continue se agravando, os professores terão que inserir em suas grades de preparação para o ensino a qualificação no combate à violência.

Também convidado para a audiência pública, o presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), Antônio Geraldo, julgou fundamental e urgente a instalação de ambulatórios psiquiátricos nas escolas para o atendimento imediato a estudantes e profissionais da educação que apresentem atitudes potenciais para o desencadeamento de ações violentas. Para tanto, ele ressaltou a necessidade de uma qualificação dos professores.

"Um ato extremo como o de Realengo poderia ser evitado se o professor fosse treinado para detectar os primeiros sintomas e ter para onde mandar esse aluno. Existem atos prévios, como o forte interesse por assuntos ligados à violência, evidências de planejamento de atitudes violentas e a discussão com colegas do que se pretende fazer, que não podem ser desconsiderados", afirmou o presidente da ABP.

Outra questão levantada pelo psiquiatra foi a generalização da violência estudantil como se fosse bullying. Segundo ele, existem doenças psiquiátricas como o Transtorno do Déficit da Atenção (TDA) e o distúrbio bipolar que podem levar o estudante ou o profissional de educação a condutas antissociais, por vezes violentas. Antônio Geraldo acrescentou que muitas vezes, esses transtornos acarretam no uso de drogas e de álcool.

Por: Agência Brasil

Prisões e Impunidade


Por Luís Flávio Sapori*
Carta Capital
Uma política pública consistente tem a capacidade de afetar a incidência da criminalidade conforme nos mostram inúmeras experiências internacionais e nacionais. Por Luís Flávio Sapori. Foto: Vanderlei Almeida/AFP
A deterioração da ordem pública na sociedade brasileira ao longo dos últimos vinte anos é fenômeno inquestionável, tornando-se fator decisivo na queda da qualidade de vida da população. O diagnóstico da situação aponta para uma nova conformação da criminalidade em nossa sociedade. Há um maior grau de violência associada aos crimes urbanos bem como verifica-se a solidificação de atividades criminosas cada vez mais organizadas e pautadas por uma racionalidade tipicamente empresarial. O desafio que se apresenta à sociedade como um todo é a reversão desta tendência que paulatinamente vai se consolidando como grave ameaça às nossas instituições democráticas.
É possível reduzir os índices de criminalidade violenta nos grandes centros urbanos brasileiros. Uma política pública consistente  tem a capacidade de afetar a incidência da criminalidade conforme nos mostram inúmeras experiências internacionais e mesmo nacionais. Sob esta ótica, é preciso superar a prática costumeira do “apagar incêndios”, caracterizada por intervenções pontuais e meramente reativas ao sabor dos acontecimentos cotidianos. Política pública de segurança exige diagnóstico da realidade, elaboração de planos de curto, médio e longo prazos, além de uma gestão qualificada dos planos elaborados.
No caso brasileiro, um dos eixos centrais de uma política de segurança pública deve ser a redução dos níveis de impunidade que vigoram em nossa sociedade. A tarefa a ser empreendida não passa prioritariamente pela acentuação do rigor da punição aos criminosos e sim pela acentuação da certeza desta punição. Não precisamos de penas mais severas ou mesmo da ampliação do leque dos crimes hediondos. Nosso objetivo deve ser o incremento das chances de um indivíduo, que tenha cometido ato criminoso, ser identificado, detido, processado e sentenciado, e uma vez condenado, ser efetivamente inserido no sistema prisional.
Aspecto relevante nesse sentido é o aumento da capacidade de absorção do sistema prisional. A taxa de encarceramento do Brasil é pouco superior a 200 presos por cem mil habitantes, tendo duplicado desde meados da década de 1990. A      despeito do crescimento acelerado, aprisionamos pouco se tomarmos como referência a magnitude da criminalidade violenta. Não há como negar que a taxa de encarceramento no Brasil destaca-se em âmbito internacional, sendo superada apenas pelos Estados Unidos, Russia e Africa do Sul. Entretanto, se balizarmos as taxas de encarceramento pelas taxas de homicídios, a realidade é bastante diferente. Façamos uma comparação da nossa realidade com a da  europa ocidental. A enorme diferença entre os níveis de violência prevalecentes na sociedade brasileira e nas sociedades européias supera em muito a diferença no aprisionamento. A taxa de homicidios no Brasil supera a taxa média de homicidios da europa ocidental em mais de 900 %. Entretanto, nossa taxa de encarceramento é apenas 200 % superior à taxa média de encarceramento  nesses mesmos países, que está em torno de 70 presos por cem mil habitantes. Em outros termos, tal comparação permite afirmarmos que dada a magnitude da violência na sociedade brasileira, nossa população prisional está subdimensionada. Não prendemos em excesso, como dizem alguns. Ao contrário, prendemos menos do que seria adequado. O elevado número de mandados de prisão não cumpridos no Brasil é um dos principais indicadores nesse sentido.
Tem sido subestimado no debate nacional o impacto da falta de vagas em nosso sistema prisional sobre os índices de criminalidade. Em sentido contrário, faz-se cada vez mais presente  a idéia de que a pena de prisão está falida. O caminho a ser percorrido em termos de investimento governamental envolveria a priorização  das penas alternativas ou mesmo a despenalização de uma série de crimes. O equívoco desta postura está numa concepção maniqueísta que tende a categorizar a pena privativa de liberdade como símbolo do mal, opondo-se às demais formas de punição penal. É inegável que as prisões brasileiras, em grande medida, assemelham-se a verdadeiras masmorras medievais. O tratamento dado ao preso não atende aos preceitos estabelecidos pela Lei de Execução Penal.  E os investimentos públicos no setor permanecem pífios. O governo federal, por exemplo, repassou em média 200 milhões de reais por ano aos estados, entre 2003 e 2010, para construção de novas unidades prisionais, compra de equipamentos, etc. Muito pouco diante da carência crônica que assola as prisões brasileiras. O que está falido, portanto, não é a pena de prisão, mas o atual modelo de gestão da pena de prisão na sociedade brasileira.
Não se está argumentando aqui que a mera ampliação dos níveis de encarceramento seja condição suficiente para reduzir os índices de criminalidade. Tal medida é uma condição necessária que deve ser contemplada em toda e qualquer política pública de segurança. Refiro-me aqui ao efeito de incapacitação da pena de prisão, fenômeno reconhecido por diversos estudiosos do tema. O encarceramento de criminosos contumazes impacta a incidência de crimes diversos dado que não teriam a oportunidade para manterem suas atividades ilícitas. A ampliação da taxa de encarceramento deve se constituir em ação governamental a ser complementada por uma série de outras que envolvem a integração das organizações policiais estaduais e federais, a ampliação e profissionalização do atendimento ao adolescente autor de ato infracional e, principalmente, pela implementação de uma vigorosa política de prevenção social da criminalidade.
*Sociólogo, Coordenador do Centro de Pesquisas em Segurança Pública da PUC Minas (CEPESP/PUC Minas), Membro do Conselho de Administração do Forum Brasileiro de Segurança Pública e Secretário Executivo do Instituto Minas Pela Paz.