quinta-feira, 1 de abril de 2010

Dois homens são presos vendendo drogas no campus da UFPE

Diario de Pernambuco - 26/06/2010

TRÁFICO

Dois homens acusados de vender drogas dentro do campus da UniversidadeFederal de Pernambuco (UFPE), na Cidade Universitária, Zona Oeste doRecife, foram presos na manhã desta sexta-feira. Carlos Dornelas CâmaraJúnior, de 23 anos, e Fernando Pontes da Silva Júnior, de 29, foram flagrados com uma sacola plástica com cerca de 200 gramas de maconha.
Segundo os policiais que participaram da operação, eles não eram alunos da instituição e estavam desempregados.
De acordo com o delegado responsável pelas prisões, Frederico Cavalcanti, titular da Delegacia da Várzea, seguranças da universidade denunciaram o comércio ilegal feito dentro do campus. Policiais militares do 12° Batalhão da PM estiveram no local e efetuaram a apreensão da droga e detenção dos acusados. Ainda segundo o delegado, eles não reagiram. "Os suspeitos não estavam armados e não tentaram fugir durante a operação", afirmou.
Alunos da UFPE comentaram o assunto e pediram mais segurança nas dependências na universidade. Muitos relatam que veem pessoas consumindo drogas pelos prédios, mas que a venda é feita de forma mais discreta. "Todo mundo sabe que existe o tráfico, mas não vemos porque isso é feito em locais mais escondidos. Quem não usa, nem passa por esses pontos", disse o estudante do curso de Turismo William Pereira, 21 anos. "Oproblema é que é muito fácil entrar aqui. Os alunos ficam muito vulneráveis e pedem mais segurança na Federal", completou uma aluna que não quis se identificar.
Sobre as queixas dos estudantes, o diretor de segurança da Universidade Federal de Pernambuco, Armando Nascimento, afirmou que as medidas tomadas pela equipe têm sido eficientes. "Prova disso é que os traficantes que atuavam aqui foram presos. Nossa parceria com a PM estádando certo. Apesar disso, falhas, inevitavelmente, podem acontecer. Afinal, em nenhum lugar a segurança é onipresente", esclareceu.
Além da venda de drogas na instituição, Carlos Dornelas e Fernando Pontes ainda atuavam em um ponto de repasse de entorpecentes, que também foi descoberto pelos PMs nessa sexta-feira. "Eles traficavam em via pública, no bairro do Engenho do Meio, também na Zona Oeste da cidade, e levavam droga desse local para a UFPE", disse Frederico Cavalcanti.
Os acusados prestaram depoimentos na Delegacia da Várzea e depois seguiram para fazer exames no Instituto de Medicina Legal (IML), no bairro de Santo Amaro, Em seguida, eles foram encaminhados ao Centro de Observação Criminológica e Triagem Professor Everardo Luna (Cotel), em Abreu e Lima, Região Metropolitana do Recife (RMR).
Por Anamaria Nascimento, do Aqui PE

VIGILANTE DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE É PRESO PORQUE VENDIA COCAINA NO CAMPUS

PLENÁRIO - A NOTÍCIA AGORA
http://www.faxaju.com.br/viz_conteudo.asp?codigo=313201018401026307
Publicado em: 31/03/2010

No início da tarde desta quarta-feira, 31, o Departamento de Narcóticos da Polícia Civil (Denarc) prendeu um vigilante da empresa Vigs. Ele vinha sendo investigado por suspeita de envolvimento com o tráfico de drogas, comercializando substâncias entorpecentes na Universidade Federal de Sergipe (UFS). Emerson Santos de Azevedo, 33 anos, foi preso no momento em que estava na guarita principal que dá acesso ao campus universitário.Com ele, os agentes civis do Denarc apreenderam uma pequena quantidade de cocaína. Mais tarde, os policiais apreenderam em sua casa outra quantidade da droga, totalizando 100 gramas. A droga estava dentro de caixas de remédios encontradas na cozinha da casa do acusado, localizada no bairro Santo Antônio. Ele trabalhava como vigilante da UFS há seis meses. “Caso seja comprovado que ele comercializava droga no campus universitário, o caso será passado para a Polícia Federal”, explicou a delegada Aliete Melo.A farda, bem como a arma utilizada pelo vigilante, foram apreendidas. O material será devolvido após o proprietário da empresa de vigilância comparecer com a comprovação do registro do armamento junto à Polícia Federal.
Emerson foi indiciado por tráfico de drogas.

MAPA DA VIOLÊNCIA 2010 - ANATOMIA DOS HOMICÍDIOS NO BRASIL

Julio Jacobo Waiselfisz
Realização: Instituto Sangari


Violência, Educação, Cidadania


Diversos fatores podem afetar negativamente o desempenho de educadores e estudantes em sala de aula. Um deles, porém, chama especialmente a atenção por seu caráter perturbador: a violência, sobretudo a que resulta em morte. Uma educação de qualidade depende, antes de tudo, de ambiente pacífico, que ofereça condições físicas e psicológicas favoráveis ao ensino e à aprendizagem.

Espaços marcados pela violência em suas diversas formas prejudicam enormemente a educação, como o comprovam numerosos estudos sobre o tema.


Atuando há 12 anos no setor de educação, a Sangari Brasil não poderia deixar de tratar da questão da violência e de estudar a situação do país nesse aspecto. Por intermédio do Instituto Sangari, portanto, a empresa vem apoiando a realização das mais recentes edições do Mapa da Violência no Brasil, com ênfase na apuração e análise sobre homicídios de jovens. E, desde 2008, a instituição tem em seu próprio corpo de dirigentes o sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz. Agora, à frente do setor de pesquisas sociais, ele prossegue na elaboração desse precioso diagnóstico das condições de vida e do cenário de oportunidades no Brasil.


Com iniciativas como o presente estudo, o Instituto Sangari espera contribuir para o enriquecimento do debate sobre a violência no país e fornecer insumos para a elaboração de políticas públicas nessa área, inclusive no âmbito educacional, que nem sempre contemplam essa questão.

Afinal, parece haver nesse aspecto uma via de mão dupla: se a violência, em suas diversas formas, tem impacto negativo na educação, também é verdade que a educação pode ter impacto positivo no enfrentamento da violência. Uma educação de qualidade para todos tem o poder de desviar da criminalidade crianças e jovens, graças às oportunidades que oferece.

Quando se trata da juventude – maioria da população em fase escolar –, a preocupação com a violência deve tornar-se ainda mais urgente. O presente Mapa demonstra, por exemplo, que considerado o tamanho da população, a taxa de homicídios entre os jovens passou de 30,0 (em 100.000 jovens) em 1980 para 50,1 no ano 2007, enquanto essa taxa, no restante da população (não jovem), permaneceu relativamente constante, inclusive com leve queda: de 21,2 em 100.000 para 19,6 no mesmo período. Segundo o autor do estudo, “isso evidencia, de forma clara, que os avanços da violência homicida no Brasil das últimas décadas tiveram como motor exclusivo e excludente a morte de jovens.”

Cabe salientar, por fim, que o atual Mapa da Violência, quinto de uma série publicada desde 1998, traz novidades. Além das tradicionais análises de dados sobre homicídios tanto na população em geral quanto entre jovens, a presente edição oferece dados com recorte de cor (raça) e gênero. Os resultados impressionam, mas o Instituto Sangari espera que, além do impacto inicial, os números aqui apresentados também levem a ações concretas e mudanças. Os jovens estudantes de todo o país merecem.

Ben Sangari - Presidente do Instituto SANGARI


Introdução

No ano de 1998 era publicado o primeiro Mapa da violência1. Nesse trabalho pretendia-se realizar uma leitura social das mortes violentas da juventude brasileira. Considerávamos já nessa época que as mortes por causas violentas representavam a ponta do iceberg de uma situação de violência bem mais generalizada, que ceifava e vitimava a juventude do país. Nem toda, nem a maior parte das violências cotidianas acabam em morte; mas a morte representa o grau extremo da violência que a relação entre os seres humanos pode atingir. Da mesma forma que as taxas de mortalidade infantil não só refletem a quantidade de crianças que estão morrendo, mas também nos dão boa ideia da infraestrutura de atendimento infantil, das epidemias, das condições de higiene e de saneamento básico, dos mecanismos culturais, políticos e sociais de tratamento das crianças etc., as taxas de mortalidade juvenil, e especificamente as atribuíveis a causas violentas, indicam também os diversos modos de sociabilidade e as circunstâncias políticas e econômicas que exprimem mecanismos específicos de negação da cidadania.

Nessa linha, e aproximadamente a cada dois anos, atualizamos dados decenais sobre a mortalidade por causas violentas no país, tendo divulgado, depois desse primeiro, mais quatro Mapas, o mais recente em 2006. O subtítulo comum dessa série foi Os jovens do Brasil, precisamente pela sua focalização na mortalidade violenta da faixa jovem. Nessa série de trabalhos, entendia-se por mortalidade violenta os óbitos por suicídio, em acidentes de transporte, por homicídio e mais uma categoria: as mortes por armas de fogo.

Com essa finalidade, eram retrabalhadas, periodicamente, as informações de óbitos disponibilizadas pela Base de Dados Nacional do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, para as faixas etárias de 15 a 24 anos e para o conjunto da população. Os cortes geográficos estudados eram: o país, as macrorregiões, as unidades federadas, as capitais dos estados e as regiões metropolitanas.

1. WAISELFISZ, J. J. Mapa da violência: os jovens do Brasil. Rio de Janeiro: UNESCO, Instituto Ayrton Senna, Garamond, 1998.

Quando elaboramos o Mapa da violência de 20042, um novo fenômeno chamou nossa atenção: se até 1999 os polos dinâmicos da violência localizavam-se nas grandes capitais e grandes metrópoles, a partir dessa data, nessas áreas, seu crescimento estagnou, mas começou a acelerar no interior dos estados. Como era um fenômeno muito recente (nessa oportunidade contávamos com dados só até o ano de 2002), ainda supúnhamos que poderia ser um fato meramente circunstancial.

Mas em 2005, quando elaboramos e divulgamos o Mapa da violência de São Paulo3, esse fato ficou bem evidente para o estado, confirmando mais tarde, no Mapa da violência 20064, a estabilidade dessa tendência, ao menos, para vários estados de grande peso demográfico no país.

Com esse processo, que denominamos Interiorização da Violência, surgiam diversas evidências de que as políticas de enfrentamento exitosas tinham um cunho marcadamente municipal: os casos de Bogotá e Cali, na Colômbia, o Tolerância Zero, de Nova York, o caso dos municípios da Região Metropolitana de São Paulo. Todas essas considerações nos levaram a propor, em 2006, a estruturação de uma nova série de Mapas, centrados agora na situação e evolução da mortalidade violenta nos 5,6 mil municípios do país. Seria a série batizada como Mapa da violência dos municípios brasileiros, que teria, além do acima mencionado, uma atualização no ano de 20085. Novamente aqui o eixo centrava-se na mortalidade violenta: óbitos por suicídio, em acidentes de transporte, por homicídio e por armas de fogo.

Diversas demandas de instituições ligadas à problemática da criança, da adolescência e da juventude, no sentido de trabalhar outras faixas etárias além da tradicional juventude, nos levaram, em 2009, a propor um estudo mais pontual, centrado, por um lado, nos homicídios, e por outro, em várias outras faixas etárias – infância, adolescência, juventude –, segundo a definição dos diversos instrumentos legais do país.

Esse foi o objetivo da elaboração deste novo Mapa: verificar o histórico, as características e tendências da violência homicida no país, em diversas faixas etárias significativas da população.

Tomando como foco a violência homicida, trabalhou-se desagregando não só para unidades federadas, capitais, regiões metropolitanas, senão também para os municípios. Perante a impossibilidade de detalhar, nesta publicação, a totalidade dos quase 5,6 mil municípios do país, optou-se por listar, em cada capítulo referente às faixas etárias – capítulos 3 a 6 – os 300 municípios mais violentos, e disponibilizar no site da instituição6 uma planilha Excel com a totalidade dos dados referentes aos 5.564 municípios do país.

2. WAISELFISZ, J. J. Mapa da violência IV: os jovens do Brasil. Brasília: UNESCO, Instituto Ayrton Senna, SEDH, 2004.
3. WAISELFISZ, J. J. e ATHIAS, G. Mapa da violência de São Paulo. Brasília: UNESCO, 2005.
4. WAISELFISZ, J. J. Mapa da violência 2006: os jovens do Brasil. Brasília: OEI, 2006.
5. WAISELFISZ, J. J. Mapa da violência dos municípios brasileiros 2008. Brasília: RITLA, Instituto Sangari, Ministério da Justiça, 2008.
6.
www.institutosangari.org.br/mapadaviolencia



1. Notas Conceituais

O contínuo incremento da violência cotidiana configura-se como aspecto representativo e problemático da atual organização da vida social, especialmente nos grandes centros urbanos, manifestando-se nas diversas esferas da vida social. Assistimos, desde o último quartel do século passado,a uma profunda mudança nas formas de manifestação, de percepção e de abordagem de um fenômeno que parece ser uma das características marcantes da nossa época: a violência. Como assevera Wieviorka 7, “mudanças tão profundas estão em jogo que é legítimo acentuar as inflexões e as rupturas da violência, mais do que as continuidades”. Efetivamente, assistimos, por um lado, a um incremento constante dos indicadores objetivos da violência: taxas de homicídios, conflitos étnicos, religiosos, raciais etc., estruturas de criminalidade, incluindo aqui o narcotráfico, corrupção nos diversos níveis do setor público e do privado etc. Mas também assistimos, nas últimas décadas, a um alargamento do entendimento da violência, uma reconceitualização, pelas suas peculiaridades atuais e pelos novos significados que o conceito assume, “(...) de modo a incluir e a nomear como violência acontecimentos que passavam anteriormente por práticas costumeiras de regulamentação das relações sociais”8, como a violência intrafamiliar, contra a mulher ou as crianças, a violência simbólica contra grupos, categorias sociais ou etnias, ofensas contra os direitos humanos etc.

Ainda que existam dificuldades para definir o que se nomeia como violência, alguns elementos consensuais sobre o tema podem ser colocados: noção de coerção ou força; dano que se produz em indivíduo ou grupo de indivíduos pertencentes a determinada classe ou categoria social, gênero ou etnia. Concorda-se, neste trabalho, com a noção de que “há violência quando, em uma situação de interação, um ou vários atores agem de maneira direta ou indireta, maciça ou esparsa, causando danos a uma ou a mais pessoas em graus variáveis, seja em sua integridade física, seja em sua integridade moral, em suas posses, ou em suas participações simbólicas e culturais”9.

7. WIEVIORKA, M. O novo paradigma da violência. Tempo Social: Revista de Sociologia da USP, v. 9, n. 1, 1997.
8. PORTO, M.S.G. A violência entre a inclusão e a exclusão social. VII Congresso Sociedade Brasileira de Sociologia. Brasília, agosto, 1997.

9. MICHAUD, Y. A violência. São Paulo: Ática, 1989.


Os estudos mais recentes sobre a violência têm se concentrado de forma crescente na área urbana, o que se explica pelo fato de que as grandes questões da sociedade se localizam, principalmente, nas grandes cidades. Segundo Dubet10, o espaço urbano aparece como sintoma, símbolo e representação “da civilização e da barbárie modernas”. Isso explica os níveis de desagregação das informações utilizados no presente estudo: Unidades Federadas, capitais dessas Unidades e suas regiões metropolitanas.

Inclusive diante das diversas evidências sobre a interiorização da violência arroladas ao longo do
estudo, estamos ainda em presença de estruturas urbanas, mas do interior dos estados.

Faltaria ainda apontar o porquê da utilização das mortes por homicídio como indicador geral de violência na sociedade, além do sentido atribuído, neste trabalho, ao conceito. Dois grupos de argumentos justificam essa decisão de utilizar homicídios como indicador geral de violência. Em primeiro lugar, e como já apontamos acima, a violência da forma anteriormente definida cobre um espectro significativamente mais amplo de comportamentos do que as mortes por homicídio.

Nem toda violência, sequer a maior parte das violências cotidianas, conduz necessariamente à morte de algum dos protagonistas implicados. Porém, a morte revela, de per si, a violência levada a seu grau extremo. Da mesma forma que a virulência de uma epidemia é indicada, frequentemente, pela quantidade de mortes que origina, também a intensidade nos diversos tipos de violência guarda relação com o número de mortes que origina.

Em segundo lugar, porque não existem muitas alternativas. O registro de queixas à polícia sobre diversas formas de violência, como ficou evidenciado em nossa pesquisa no Distrito Federal11, tem uma notificação extremamente limitada. Nos casos de violência física, só 6,4% dos jovens denunciaram à polícia; nos casos de assalto/furto, só 4%; nos casos de violência no trânsito, só 15%.

Já no campo dos óbitos, contamos com um Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) que centraliza informações sobre as mortes em todo o país.

Dada a utilização desse Sistema, entenderemos como morte violenta, no contexto do presente estudo, os óbitos acontecidos por homicídios, ou seja, agressões intencionais fatais. O que permite unificar, numa categoria única, circunstâncias pouco semelhantes? Diferentemente das mortes por causas endógenas, que remetem a uma deterioração da saúde causada por algum tipo de enfermidade ou doença, nos casos aqui tratados, a morte é resultado de uma intervenção humana, ou seja, resultado de alguma ação dos indivíduos originando danos que levam à morte de outras pessoas.

10. DUBET, F. Penser le sujet. S/l. Fayard, 1995.
11. WAISELFISZ, J. J. Juventude, violência e cidadania. Os jovens de Brasília. São Paulo: Cortez/UNESCO, 1998.



Se cada uma dessas mortes tem sua história individual, seu conjunto de determinantes e causas, diferentes e específicas para cada caso, irredutíveis em sua diversidade e compreensíveis só a partir de seu contexto específico, sociologicamente falando temos de apontar, como será evidenciado ao longo do trabalho, sua regularidade e constância. Um número determinado de homicídios acontece todos os anos, levemente maior ou menor que o número de mortes ocorridas no ano anterior.

Sem muito esforço, a partir desses dados, poderíamos prognosticar com certa margem de erro, quantas pessoas morreriam em nosso país no próximo ano por homicídio. E são essas regularidades que nos possibilitam inferir que, longe de ser resultado de decisões individuais tomadas por indivíduos isolados, estamos perante fenômenos de natureza social, produto de determinantes que se originam na convivência dos grupos e nas estruturas da sociedade.

Durkheim12, em fins do século XIX, escreveu um tratado sobre o tema do suicídio que pode ser considerado uma das pedras basais da moderna sociologia. Ressaltava o autor que as taxas de suicídio representam um excelente indicador da situação social, e que seus movimentos se encontram fortemente associados a problemas gerais que afetam o conjunto societal. Entendia ele que a sociedade não é simplesmente o produto da ação e da consciência individual. Pelo contrário, as maneiras coletivas de agir e de pensar resultam de uma realidade exterior aos indivíduos que, em cada momento, a elas se conformam. O tratamento do crime, da violência e do suicídio como fato social permitiria reabilitar cientificamente esses fenômenos e demonstrar que a prática de um crime depende não tanto do indivíduo, senão das diversas formas de coesão e de solidariedade social.

Do mesmo modo, ao longo deste trabalho, pretendemos indicar que as diversas formas de produção homicida, longe de serem produtos aleatórios de atores isolados, configuram “tendências” que encontram sua explicação nas situações sociais, políticas e econômicas que o país atravessa.

Também a definição de faixas etárias correspondentes às diversas etapas do “ciclo de vida” do ser humano pode adquirir conotações diversas e passíveis de serem identificadas segundo os interesses de cada área do conhecimento, de cada sociedade e/ou cultura, de cada momento histórico.

A alternativa fácil do recorte etário, se por um lado introduz uma referência concreta, não permite superar o problema da caracterização dos conceitos que iremos utilizar ao longo do trabalho: criança, adolescente, jovem. Mas, inclusive em relação às faixas etárias, também existem divergências na definição das categorias. Em geral, hoje são reconhecidas, como etapas do ciclo de vida: a infância, a adolescência, a idade jovem, o adulto jovem, a idade adulta e a velhice. Nas categorias que iremos utilizar neste documento, seguiremos as definições etárias das instituições que operam no país com tais categorias:

• Criança. Estatuto da Criança e do Adolescente: de 0 a 12 anos incompletos.
• Adolescência. Estatuto da Criança e do Adolescente: de 12 a 18 anos de idade.
• Jovem. Sistema Nações Unidas: de 15 a 24 anos de idade.
• Jovem.
Secretaria Nacional de Juventude: de 15 a 29 anos de idade, pela incorporação da noção de adulto jovem.

12. DURKHEIM, E. O suicídio: estudo sociológico. Lisboa: Presença, 1996.


Se o termo infância nos remete aos termos criança e adolescência, que encontram-se referenciados por fortes indicadores físicos e fisiológicos, o termo juventude é muito mais recente e nos remete a definições socialmente delimitadas. Para a Organização Pan-americana da Saúde e a Organização Mundial da Saúde (OPS/OMS), adolescência e juventude diferenciariam-se pelas suas especificidades fisiológicas, psicológicas e sociológicas. Para a OPS/OMS13, a adolescência constituiria um processo fundamentalmente biológico durante o qual se acelera o desenvolvimento cognitivo e a estruturação da personalidade. Abrangeria as idades de 10 a 19 anos, divididas nas etapas de pré-adolescência (dos 10 aos 14 anos) e de adolescência propriamente dita (de 15 a 19 anos). Já o conceito juventude resumiria uma categoria essencialmente sociológica, que indicaria o processo de preparação para os indivíduos assumirem o papel de adultos na sociedade, tanto no plano familiar quanto no profissional, estendendo-se dos 15 aos 24 anos, ou 15 a 29, no entendimento das instituições brasileiras.
13. OPS/OMS. La salud del adolescente y el joven en las Américas. Washington, DC, 1985.


2. Notas Técnicas

A partir do ano de 1979, o Ministério da Saúde passou a divulgar o seu Subsistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) cujas bases de dados foram utilizadas como fonte principal para a elaboração do presente estudo.

Pela legislação vigente no Brasil (Lei nº 15, de 31/12/73, com as alterações introduzidas pela Lei
nº 6.216, de 30/06/75), nenhum sepultamento pode ser feito sem a certidão de registro de óbito
correspondente. Esse registro deve ser feito à vista de atestado médico ou, na falta de médico na
localidade, por duas pessoas qualificadas que tenham presenciado ou constatado a morte.

A certidão, normalmente, fornece dados relativos a idade, sexo, estado civil, profissão, naturalidade e local de residência. Determina, igualmente, a legislação que o registro do óbito seja sempre feito “no lugar do falecimento”, isto é, no local da ocorrência do evento. Visando ao interesse de isolar áreas ou locais de “produção” de violência, utilizou-se no presente trabalho este último dado, o do local de ocorrência, para a localização espacial dos óbitos. Isso, porém, não deixa de trazer alguns problemas que, no formato atual da certidão de registro, não têm solução. É o caso das situações onde o “incidente” causante do óbito acontece em local diferente do lugar de falecimento. Feridos em “incidentes” levados para hospitais localizados em outros municípios, ou até em outros estados, aparecem contabilizados “no lugar do falecimento”.

Outra informação relevante para o nosso estudo, exigida pela legislação, é a causa da morte.

Até 1995, tais causas eram classificadas pelo SIM seguindo os capítulos da nona revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-9). A partir daquela data o Ministério da Saúde adotou a décima revisão (CID-10).

Os aspectos de interesse para o presente estudo estão contidos no que o CID-10, em seu Capítulo XX, classifica como “causas externas de morbidade e mortalidade”. Quando um óbito devido a causas externas (acidentes, envenenamento, queimadura, afogamento etc.) é registrado, descreve-se tanto a natureza da lesão como as circunstâncias que a originaram. Assim, para a codificação dos óbitos, foi utilizada a causa básica, entendida como o tipo de fato, violência ou acidente causante da lesão que levou à morte. Dentre as causas de óbito estabelecidas pelo CID-10, foi utilizado o agrupamento X85 a Y09, que recebe o título genérico de Agressões. Este capítulo caracteriza-se pela presença de uma agressão de terceiros, que utilizam qualquer meio para provocar danos, lesões ou a morte da vítima.

As informações usadas sobre a cor/raça das vítimas são as que constam no sistema. O SIM começou a incorporar essa informação com a adoção, em 1996, do CID-10, utilizando o mesmo esquema classificatório do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): branca, preta, amarela, parda e indígena. Mas, nos primeiros anos, até praticamente 2000, o sub-registro da cor/raça das vítimas era muito elevado. Por tal motivo, começamos a considerar essa informação a partir do ano de 2002, quando 92% das vítimas de homicídios, acidentes de transporte e suicídio já tinham a informação de raça/cor. Além disso, para simplificar as análises, as categorias preta e parda foram somadas para constituir a categoria negra, e foram desconsideradas as categorias amarela e indígena por seu baixo número na população (entre ambas, menos de 0,5%).

Nesta quinta versão do Mapa da Violência, da mesma forma que na primeira e na quarta versões, foram desenvolvidas análises específicas relativas às regiões metropolitanas do país. Foram estudadas, nessas análises, as nove regiões metropolitanas tradicionais – Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre – criadas ao longo da década de 1970, agregando também a região metropolitana de Vitória, que, por ser bem mais recente, apresenta um interesse específico quando se trata de analisar a violência letal no país.

Para as comparações internacionais, foram utilizadas as bases de dados de mortalidade da Organização Mundial da Saúde14 (OMS) em cuja metodologia se baseou o nosso SIM. Tal fato propicia que ambas as séries de dados sejam totalmente compatíveis, possibilitando comparações
internacionais em larga escala. A partir dessas bases, foi possível completar os dados de mortalidade de 82 países que utilizam o CID-10. Mas, como os países demoram em atualizar os dados na OMS, não foi possível emparelhar todos os dados para o mesmo ano. Assim, utilizaram-se os últimos dados disponibilizados pela OMS que, segundo o país, variam de 2000 a 2004. Os dados da Colômbia, por estarem desatualizados nessa base, foram obtidos diretamente do seu Departamento Administrativo Nacional de Estatística – DANE.

Não se pode negar que as informações do sistema de registro de óbitos ainda estão sujeitas a uma série de limitações e críticas, expostas pelo próprio SIM15, e também por outros autores que trabalharam com o tema (Mello Jorge16; Ramos de Souza et al.17).

14. WHOSIS, World Health Organization Statistical Information System. World Mortality Database.
15. SIM/DATASUS/MS. O Sistema de Informações sobre Mortalidade. S/l, 1995.
16. MELLO, Jorge. Como Morrem Nossos Jovens. In: CNPD. Jovens acontecendo na trilha das políticas públicas. Brasília, 1998.
17. RAMOS de SOUZA, et al. Qualidade da informação sobre violência: um caminho para a construção da cidadania. INFORMARE – Cadernos do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Informação. Rio de Janeiro, v.2, n.1, jan./jun. 1996.

A primeira grande limitação, assumida pelo próprio SIM, é o sub-registro. Esse sub-registro se deve, por um lado, à ocorrência de inúmeros sepultamentos sem o competente registro, determinando uma redução do número de óbitos declarados. Por outro lado, também a incompleta cobertura do sistema, fundamentalmente nas regiões Norte e Nordeste, faz com que a fidedignidade das informações diminua com a distância dos centros urbanos e com o tamanho e disponibilidades dos municípios. O próprio SIM18 estima que os dados apresentados em 1992 podem representar algo em torno de 80% dos óbitos acontecidos no país. Mas, pelas evidências existentes, esse sub-registro afeta bem mais as mortes por causas naturais do que as mortes violentas.

Não só a quantidade, mas também as qualidades dos dados têm sofrido reparos: mortes sem assistência médica, o que impede o apontamento correto das causas e/ou lesões; deficiências no preenchimento adequado da certidão etc. Apesar dessas limitações do SIM, existe ampla coincidência em indicar, por um lado, a enorme importância desse sistema e, por outro, a necessidade de seu aprimoramento.

Para o cálculo das taxas de mortalidade, foram utilizadas as estimativas intercensitárias disponibilizadas pelo DATASUS/MS, baseado em estimativas populacionais do IBGE. Contudo, estas estimativas intercensitárias oficiais não estão desprovidas de uma certa margem de erro.

Assim, por exemplo, as estimativas oficiais utilizadas para o ano 2000 (inclusive pelo Tribunal de Contas da União – TCU – para os fundos de participação) davam conta de uma população total de 166,1 milhões de habitantes para o Brasil. Mas o Censo Demográfico desse ano revelou que, na verdade, existiam 169,8 milhões, o que representa um erro de 2,2% nas estimativas. Quanto à elaboração do Mapa II, as informações populacionais disponíveis e utilizadas foram as estimativas do IBGE. Já no Mapa III, foram utilizados os resultados preliminares do Censo 2000, e reestimados os dados populacionais a partir de 1996 para dar maior precisão às taxas.
Por isso, entre as versões II e III, podem existir pequenas diferenças nas taxas, fundamentalmente entre os anos de 1996 e 1998.

Para a atual versão, foram novamente utilizadas as estimativas do IBGE disponibilizadas pelo DATASUS/MS.

Uma última ressalva deve ser colocada. Refere-se à peculiar situação do Distrito Federal, cuja organização administrativa específica determina que os parâmetros da UF coincidam com os de Brasília como capital. Em muitos casos, quando tratada como UF, ela apresenta valores relativamente altos, devido a sua peculiar forma de organização e elevado grau de urbanização, focus da violência homicida.

18. SIM/DATASUS/MS op. cit.



3. Homicídios na População Total

3.1. Evolução dos Homicídios nas Unidades Federadas

Na década 1997/2007, o número total de homicídios registrados pelo SIM passou de 40.507 para 47.707, o que representa um incremento de 17,8%, pouco inferior ao incremento populacional do período que, segundo estimativas oficiais, foi de 18,6%.

No Gráfico a seguir pode ser visto que o número de homicídios cresceu sistemática e significativamente até o ano de 2003, com incrementos elevados: em torno de 5% ao ano. Já em 2004, essa tendência se reverte, quando o número de homicídios cai 5,2% em relação a 2003. Essa queda – como veremos mais adiante – pode ser atribuída às políticas de desarmamento desenvolvidas a partir de 2003.

Gráfico 3.1.1. Evolução do Número de Homicídios. Brasil, 1997/2007.

Com menor intensidade, as quedas continuam ao longo de 2004, mas a partir desse ano os números absolutos começam a oscilar: elevam-se em 2006 e caem novamente em 2007. Levando em conta o crescimento populacional do período, as Taxas de Homicídio – Gráfico 3.1.2. e Tabela 3.1.1. – permitem observar que, ainda nesse último tramo – 2006 e 2007 –, registram-se quedas nas taxas de homicídio, ainda que bem menos expressivas se comparadas ao período anterior – 2003/2005.

Se focarmos a situação e evolução nas grandes regiões do país, ou nas Unidades da Federação, teremos um panorama bem mais complexo e heterogêneo.

A Tabela 3.1.1. permite verificar que na década estudada todas as regiões, salvo a Sudeste, evidenciam crescimento no volume de homicídios. E em todas elas o ritmo de crescimento foi significativamente superior à média nacional de 17,8%. Neste sentido, destacam-se as regiões Norte e Nordeste, onde os elevados índices de crescimento de Maranhão, Pará e Alagoas fazem quase triplicar o número de homicídios da década analisada. Mas também Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe ostentam elevados índices de crescimento, levando as regiões a sustentar incômodas taxas de crescimento de 97,9% (Norte) e 76,5% (Nordeste). Também o Sul mostra um expressivo aumento (62,9%) no número de homicídios, puxado pelo incremento de 96,2% do Paraná. Já no Centro-Oeste, os homicídios cresceram em ritmo menor: 33,8%, mas também acima da média nacional. Mas é na região Sudeste onde encontramos a maior polarização: por um lado, Minas Gerais, onde os homicídios cresceram 213,9%, isto é, mais que triplicou o número de homicídios, ainda que com indícios de processo de reversão a partir de 2004, processo mais evidente ainda em sua Capital e Região Metropolitana, com veremos mais à frente. No outro extremo, São Paulo, com quedas expressivas e sistemáticas a partir de 1999, onde o número absoluto de homicídios, em 2007, fica reduzido à metade do nível de 1997.

Dado o elevado peso demográfico do Estado de São Paulo, suas quedas puxam para baixo não só os índices regionais, que caem 20,3%, mas também os nacionais. Também o Rio de Janeiro, com menor intensidade que São Paulo, vê seu número absoluto de homicídios cair 20,8% na década, principalmente a partir de 2002, coincidindo temporalmente com a Campanha do Desarmamento.

Focando as Unidades Federadas, ficam evidentes modos de evolução altamente heterogêneos e diferenciados, com extremos que vão de Maranhão, Pará, Alagoas e Minas Gerais, onde os índices decenais se elevam drasticamente, até uns poucos estados, como São Paulo e Rio de Janeiro e, em menor medida, Mato Grosso do Sul, cujos números caíram na década considerada.

Tabela 3.1.1. Número de Homicídios na População Total por UF e Região. Brasil, 1997/2007.

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Mas o que realmente impressiona nesses números são suas magnitudes. No ano de 2007, com todas as quedas havidas, aconteceram acima de 47,7 mil homicídios, o que representa 131 vítimas diárias. Isto representa um número bem maior que um massacre do Carandiru19 a cada dia desse ano. Na década analisada morreram por homicídio nada mais, nada menos que 512 mil pessoas.

Tomando em consideração o crescimento populacional, a evolução na década apresenta-se como uma grande pirâmide – Gráfico 3.1.2. – com os anos extremos praticamente idênticos (25 homicídios em 100 mil habitantes) e um pico pronunciado nos anos centrais – 2002 e 2003 –, quando as taxas se elevam para quase 29 homicídios em 100 mil habitantes.

Em 18 das 27 Unidades Federativas, a década trouxe incremento nas taxas de violência homicida, com casos extremos como os de Alagoas, Maranhão e Minas Gerais, onde os índices aumentam de 150% para cima. Só em 9 unidades o crescimento foi negativo, incluindo o já mencionado caso de São Paulo, onde os índices caem 58,6%.
Gráfico 3.1.2. Evolução das Taxas de Homicídio (em 100.000). Brasil, 1997/2007.

19. Um tumulto na Casa de Detenção do Complexo de Carandiru, na zona norte de São Paulo, originou a intervenção das forças policiais que deixou um saldo de 111 mortes segundo os dados oficiais. Esse fato ficou conhecido internacionalmente como “Massacre do Carandiru”.

Tabela 3.1.2. Taxas de Homicídio (em 100.000) na População Total por UF e Região. Brasil, 1997/2007.

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Essas mudanças alteram o mapa tradicional dos homicídios no país, como pode ser visto na Tabela 3.1.3., onde encontramos as Unidades Federadas ordenadas pela situação de suas taxas de homicídio em 1997 e em 2007.

Um estado como Alagoas, que até poucos anos atrás apresentava taxas moderadas, abaixo da média nacional, em poucos anos passa a liderar o ranking da violência homicida, com crescimento vertiginoso a partir de 1999. De forma semelhante, Paraná e Pará, que em 1997 apresentavam índices relativamente baixos, em 2007 passam a ocupar lugares de maior destaque nesse mapa da violência. No sentido contrário, São Paulo, que com sua taxa de 29,1 homicídios em 1997 ocupava a 5ª posição nacional, em 2007, dez anos depois, com taxa de 17,1 homicídios em 100 mil habitantes, caiu para a 25ª posição.

Tabela 3.1.3. Ordenamento das UF por Taxas de Homicídio (em 100.000) na População Total. Brasil, 1997/2007

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3.2. Evolução dos Homicídios nas Capitais

Considerando exclusivamente as Capitais, é possível verificar que a evolução decenal de homicídios foi inferior à experimentada pelas UF como um todo, indicando que os polos dinâmicos da violência homicida já não se concentram nas grandes capitais do país, como teremos oportunidade de analisar mais à frente. Com 17.249 homicídios em 1997, o quantitativo nas capitais cai para 16.490 em 2007, o que representa uma diminuição de 4,4% na década (contra 17,8% de aumento nas UF). Isto, de per si, já está a indicar uma mudança nos padrões vigentes até fins da década de 90, período caracterizado por fortes incrementos concentrados nas capitais e nas grandes metrópoles do país, como teremos oportunidade de evidenciar no item 3.4.

Gráfico 3.2.1. Evolução do Número de Homicídios nas Capitais. Brasil, 1997/2007.